quinta-feira, 30 de junho de 2011

Comentários periféricos sobre uma importante vitória


Bahia 0x1 Corinthians
Brasileirão 2011


Rafael Soares

Um resultado importante que veio com muito sufoco. Diante de Pituaçu lotado e de um Bahia desfigurado, sem muitos de seus titulares, o Corinthians arrancou uma importante vitória que lhe garantiu a liderança do campeonato.

Escrevo para falar menos do jogo como um todo e mais de algumas coisas específicas. Em primeiro lugar me impressionou positivamente a vontade e o empenho que o jogadores do Corinthians demonstraram na marcação. A aplicação era tanta no primeiro tempo que me perguntava se iria sobrar algum fôlego para o segundo. E sobrou, pois a "pegada" continuou similar.

Como já anunciei que não faria nenhuma análise sistemática da partida, volto agora minha atenção às novas peças do elenco que entraram no segundo tempo. Diante da pressão imposta pelo Bahia, Alex e Sheik pouco fizeram. Porém, me preocupa menos o que produziram ou deixaram de produzir nesta partida e mais a atitude, dentro e fora de campo, do segundo. Das duas partidas que vi, fiquei receoso com uma certa firula sem propósito do Sheik e do que escreveu no seu twiter após a goleada contra o São Paulo. É preciso ter mais objetividade e seriedade dentro das quatro linhas e não é com um jogo que se vira "mais um louco do bando", isso leva tempo e comprometimento. Por fim, acredito que seja melhor deixar que os torcedores façam as piadas e ironizem os adversários.

* Rafael Soares, corinthiano, é colaborador do Ludopédicas.

Jogando pela janela

Antonio Prata


Curiosos são os caminhos do engenho humano. Tome o caso do futebol e das janelas, por exemplo. Por mais de cem anos, os dois viveram isolados, sem que nenhum torcedor percebesse o potencial lúdico e ofensivo desta união. Eis então que, em algum momento da década de 90 do século passado, a centelha da inventividade espocou nos neurônios de um boleiro, trazendo-lhe a brilhante ideia de escancarar as persianas, cravar as mãos na esquadria e dividir com o quarteirão suas fantasias mais íntimas: "Chuuuuuuupa porco!". Estava criada, assim, uma nova forma de comunicação: o insulto-futebolístico-intercondominial.

Embora já faça mais de uma década que, pelas janelas do meu bairro, porcos, bambis, peixes e gambás intimem-se mutuamente à felação, ainda não consegui me acostumar com o fenômeno. Toda quarta e domingo, salto do sofá ao primeiro grito, deixando cair das mãos o livro ou o controle remoto, crente que está pegando fogo no prédio, que estão assaltando o apartamento de cima. Fecho as janelas, aumento o volume, mas é difícil me concentrar com as imagens que cruzam o céu da cidade, dignas de um quadro de Bosch, de um dos "Caprichos de Goya", de uma versão hardcore da Arca de Noé, por Robert Crumb: homens com camisetas de seus times, as calças arriadas, recebendo fellatios de peixes, porcos, de gambás, do Bambi.

A relação entre o esporte bretão, a zoofilia e o sexo oral é um mistério a ser desvendado por psicólogos, cientistas sociais e semiólogos. A este modesto cronista cabe apenas levantar perguntas mais simples. Por exemplo: se desde o início da humanidade há janelas e discórdias, por que foi somente o futebol que deu às fenestras o atual status de arena?

Ou estarei errado, e nas noites estreladas da Grécia antiga ecoavam provocações como "chuuuuuupa, tebano frouxo!", "cala a boca, espartano maloqueiro!"? Terão as vozes se levantado entre os muros dos castelos, defendendo protestantes e católicos: "Vaaaaaai Luteroooo!", "Eô, eô, torquemada é um terror!"?

Acredito que não. Se a comunicação intercondominial já existisse no passado, teriam chegado até nós outros exemplos, para além das tranças de Rapunzel. Ao que parece, o fenômeno é recente e está só começando. Pelo que noto aqui em Perdizes, já não se restringe ao ludopédio. Várias vezes por semana, alunos do Mackenzie urram, de forma nada polida, sua superioridade sobre os estudantes da PUC, ao que os filhos da PUC respondem, na mesma altura e baixeza; um tal de Arthur tem sido constantemente insultado, e há também meras manifestações de júbilo, encarnadas neste gritinho tão irritante que, desde o surgimento do Big Brother, disseminou-se como uma praga pelo país: "Uhu!".

Faz algumas semanas, li neste caderno que uns prédios já estão multando seus condôminos berrões. Acho bom. E iria além: em caso de reincidência, o linguarudo deveria perder o direito à janela, assim como um motorista inábil perde a habilitação. Acimentem-se as fenestras: o sujeito terá que viver para sempre num cubo sombrio, ouvindo o eco das próprias palavras e refletindo sobre seus obscuros significados.


antonioprata.folha@uol.com.br
@antonioprata
FOLHA.com
Blog "Crônica e Outras Milongas"
antonioprata.folha.blog.uol.com.br  

*Publicado na Folha de S.Paulo, em 29/06/2011.

Tragédia argentina



Das dores que sofre um homem na vida, são particularmente intensas aquelas causadas pelo time do coração. Quem não sofreu uma derrota daquelas em que a gente passa dias e dias sem se conformar? O que dizer, então, de uma desclassificação. Ou da derrota em final de campeonato!

Porém, dessas dores ludopédicas, nada se compara à de um rebaixamento. Falo com propriedade, já que a sofri há poucos anos. Em 2007, para ser mais preciso, quando “meu” Corinthians passou pelo vexame do descenso no certame nacional. Assisti a toda aquela fatídica partida contra o Grêmio sentado no chão da sala, com a televisão sem volume. Na verdade, não assistia ao jogo, mas rezava. Ou, talvez, observava aquela movimentação de jogadores como quem vê um moribundo na cama, à beira da morte, implorando para que o quadro crítico seja revertido. Em vão...

Quando o árbitro apita o final da partida, também encerra a esperança e abala profundamente o orgulho atrelado àquela camisa e àquele escudo. Emerge ali uma sensação amarga de incredulidade, de impotência, de indignidade, de vergonha e, ao mesmo tempo, de raiva. Os gritos e xingamentos durante a partida dão lugar às lágrimas e, depois, à revolta. Não são incomuns as reações violentas como as observadas no Couto Pereira, em Curitiba, em 2009, ou como as que acometeram Buenos Aires, domingo passado, após a queda do tradicionalíssimo River Plate, equipe da preferência de 18 milhões de argentinos e dono de 33 canecos nacionais, 2 Libertadores e um mundial interclubes.

Apesar das aparências, em que pese a frieza do juízo gerado pelas imagens incontestes, toda aquela revolta quiçá não se deva a simples vândalos, como vociferam os racionais comentaristas de ocasião, mas a seres humanos, demasiado humanos. Afinal, futebol, acima de tudo, é paixão; para os argentinos, em especial, alguns níveis acima do padrão médio de passionalidade, é mais uma fonte de tragédia!

Óbvio, não justifico a violência e os atos de vandalismo. Sim, têm que ser punidos os responsáveis, doa a quem doer, sem a desculpa de que agiram sob “forte emoção”. Por outro lado, não deixo de tentar entender o fenômeno: o futebol não é mero jogo, mas paixão; não se trata de um confronto de “peças” movidas sob a lógica de planos táticos, mas de homens que representam uma camisa e uma história, inspiradoras de orgulho em milhões de fiéis apaixonados.

Aos hermanos torcedores do grande clube de Nuñez, vai aqui uma dica de quem já sofreu essa experiência e sua peculiar dor: ao fim e ao cabo, sejam otimistas. Sim, até porque há razões para sê-lo. Nada melhor que o dia seguinte e a busca por sair do fundo do poço para que se reavive o brio e o amor ao time. O orgulho ferido é uma grande força para que se façam revoluções. E o rebaixamento é uma clara evidência de que certa revolução clubística é necessária. Prova disso é que, via de regra, os clubes que passaram por semelhante vexame, lotaram seus estádios no decorrer na campanha na segundona, viram seus torcedores renovarem seu amor ao escudo – aliás, não há momento mais apropriado para que o torcedor queira mostrar sua paixão pelo clube do que na luta pela volta à primeira divisão –, e conseguiram o ascenso logo em seguida. Que o digam, além do Timão, outros grandes brasileiros como o Atlético Mineiro, o Coritiba, o Grêmio, o Palmeiras, o Botafogo, o Bahia, o Fluminense.

Se isso ocorre na terra de Garrincha e Pelé, também deve acontecer no país de Messi e Maradona.

JFQ

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Estreia com vitória. E sufoco



Brasil 1x0 Austrália
Copa do Mundo de Futebol Feminino


Terminou há pouco a partida entre Brasil e Austrália, pelo Mundial Feminino, na Alemanha. Em busca do primeiro título, nossa seleção obteve uma vitória magra, por um a zero, mas importantíssima para a classificação. No grupo do Brasil (Grupo D), além da Austrália, também estão Guiné Equatorial e Noruega (ver classificação: http://globoesporte.globo.com/futebol/mundial-feminino/#/classificacao-e-jogos ).

Embora tenha somado os três pontos, nossa seleção mostrou falhas que precisam ser sanadas. Tanto no primeiro tempo, como depois do gol de Rosana, aos 9 minutos do segundo, o Brasil conteve muito mal as seguidas investidas da seleção australiana. Em uma oportunidade, inclusive, aos 42 da segunda etapa, a jogadora australiana Vanna só não marcou um gol “feito” porque forçou demais na tentativa de encobrir a goleira Andreia. Mera questão de azar (delas).

Além das dificuldades da defesa brasileira em contem as subidas das adversárias, o meio-campo também foi bastante ineficiente em organizar ataques, apesar da presença da genial Marta. As melhores subidas do Brasil foram pelas pontas, não obstante os cruzamentos raramente encontrarem alguém na área para finalizar.

O dia foi de pouca inspiração, mas conseguimos o que mais interessa em uma estreia: a vitória. Aliás, tomar sufoco faz parte de uma espécie de tradição nas estreias de mundiais, femininos ou masculinos.

Espera-se que a partir da próxima partida, contra a forte Noruega, dia 3/7, o escrete de Marta, Cristine, Érika, Formiga, Maurinne e companhia, além de vencer, também convença. Provavelmente, será o jogo a definir a primeira classificada do grupo.

JFQ

terça-feira, 28 de junho de 2011

Corinthians, o único


Juca Kfouri

Único invicto entre os paulistas neste Campeonato Brasileiro; único time a derrotar, e golear, o líder São Paulo até aqui; único a jamais ter feito a festa que os santistas fazem pela terceira vez, assim como os tricolores já fizeram outras três e os palmeirenses ao menos uma; este é o Corinthians, único também entre os grandes de São Paulo sem casa própria.

E foi no Pacaembu, na casa que virou sua sem sê- -la, que o Timão se aproveitou dos desfalques são- -paulinos e o venceu sem dificuldades depois que o tricolor ficou com dez em campo, ainda no primeiro tempo.

Os 5 a 0 foram a exata tradução da superioridade alvinegra, coroada com olé e uma infinidade de bolas entre as pernas.

Pois o Corinthians é tão grande, e aparentemente tão mais importante que os rivais, embora não possa concorrer com nenhum deles na relevância dos troféus conquistados, que impressiona como nenhum de seus adversários festeje coisa alguma sem fazer questão de lembrá-lo.

Se é ainda polêmica a tese freudiana sobre a inveja que a mulher teria do pênis, parece indiscutível o ciúmes que o tamanho da torcida corintiana desperta em seus concorrentes.

Porque não há outra explicação para as inúmeras agressões à nação corintiana em meio aos mais que justificados festejos praianos, assim como acontece quando a festa é alviverde ou tricolor - ou até mesmo rubro-negra e colorada.

Se é raro que o Corinthians tenha uma direção que chame a atenção por suas qualidades, como na época dourada da "Democracia Corinthiana", é frequente que se veja apontados entre os defeitos do seu comando os mesmos que se apresentam nos demais clubes.

E se o Corinthians não é o único dos grandes paulistas a conhecer a segunda divisão, só ele ganhou o primeiro Mundial de Clubes da Fifa, apesar de também apenas ele ter o título contestado.

Quem sabe um dia o Corinthians seja visto como mais um, depois de ganhar sua Libertadores e inaugurar o seu estádio, sobre o qual, com razão, pairam as mesmas críticas que um dia recaíram sobre o Morumbi, justa ou injustamente.

Porque imaginar o Corinthians com torcida menor do que alguém é perda de tempo, o que deixa um único caminho aos rivais: o de se dar conta que se nem festa são capazes de fazer sem lembrar a existência corintiana é porque importante mesmo é quem é sempre lembrado.

* Publicado na Folha de S.Paulo, em 27/06/2011.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Invictos e renascidos, entre o chocolate e o desandar da maionese



Corinthians 5x0 São Paulo

Mesmo após o sacolejo que tomou no Pacaembu, ontem, o São Paulo continua líder do campeonato brasileiro. Na minha modesta opinião, o 5 a 0 se explica menos pela expulsão de Carlinhos Paraíba – justa, diga-se de passagem –, do que pela perda de parte importante do elenco Tricolor: Lucas, Casemiro, Miranda, Rhodolfo. O São Paulo começou bem o clássico; quiçá, começou melhor que o Corinthians. Os dois times, aliás, partiram para a partida com proposta igual: marcação em cima e velocidade nas subidas, especialmente em contra-ataques.

O São Paulo manteve Dagoberto e Fernandinho bem abertos, enquanto Marlos buscava a ligação. A revelação são-paulina Wellington marcava bem no meio-campo, apesar de nitidamente nervoso durante toda a partida. Enquanto esteve em campo, Carlinhos Paraíba desempenhou importante função de marcar e de auxiliar Marlos na ligação com o ataque. Os jovens Bruno Ovini, Luiz Eduardo e Bruno Caio não tiveram um mau desempenho, mas a ausência de entrosamento pesou.

Do lado corinthiano, ainda mais motivado por conta da última derrota para o rival, a marcação também foi implacável – destaque para Paulinho e Ralf – e os ataques eram feitos também pelos flancos, com Willian pela direita e, principalmente, com Jorge Henrique e Danilo pela esquerda.

Pode-se dizer que foram duas partidas distintas: o primeiro tempo, muito equilibrado, e o segundo, quando o Timão deu baile. Após o primeiro gol, do ex-são paulino Danilo, só deu Corinthians. Com um a menos e precisando atacar, o Tricolor se abriu e, para piorar, os jogadores do alvinegro não mais erraram passes. Além disso, o até então adormecido Liedson resolveu compensar todas as atuações apagadas neste campeonato, mostrando todo seu talento de atacante matador: marcou três gols seguidos. Para fechar com chave de ouro, até o ídolo tricolor Rogério Ceni, que poderia marcar seu centésimo gol em jogos oficiais – justo contra o Corinthians, em quem fez o centésimo da carreira! – sofreu um frango no chute de longa distância de Jorge Henrique.

Em outras palavras – palavras boleiras –, enquanto desandava a maionese são-paulina, o Corinthians aproveitou para aplicar um chocolate.

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Flamengo 4x1 Atlético Mineiro

Um enredo muito parecido foi observado na partida entre Flamengo e Atlético Mineiro, no Engenhão. Neste caso, o Galo também começou bem a partida, mantendo uma vitória parcial de 1 a 0, dos 7 até os 21 minutos do segundo tempo, quando Ronaldinho Gaúcho marcou um golaço. A partir daí, o Mengo acertou seus passes, Ronaldinho resolveu renascer das vaias para o futebol, senão primoroso, minimamente bem jogado, como dele se espera. Além dele, Deivid, que entrou no lugar de Wanderley, também surpreendeu – ao menos, os acostumados com o fraco desempenho das suas últimas atuações – e marcou dois gols. Thiago Neves, em boa partida, também marcou o dele. Destaque ainda para Renato Abreu, marcando bem e ajudando na distribuição das jogadas e investidas ao ataque.

Resumindo, assim como no Majestoso jogado no Pacaembu, de uma hora para outra, o que parecia equilíbrio tornou-se uma mistura de chocolate rubro-negro com maionese mineira desandada.

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Detalhe: Corinthians e Flamengo são os dois únicos invictos do campeonato.

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Palpite: o Corinthians é forte candidato ao título brasileiro deste ano. O São Paulo, apesar da goleada, e o Flamengo, feitos alguns ajustes, também devem permanecer nas primeiras colocações no decorrer do certame. Vasco, Cruzeiro e Internacional também merecem respeito. E que todos eles tenham muito cuidado com o Santos, especialmente quando o Peixe deixar a comemoração da Libertadores para trás e estiver com elenco completo e compenetrado neste campeonato que é especialidade do professor Muricy.

JFQ

sábado, 25 de junho de 2011

Dois meninos

O ano: 1950. O menino brincava enquanto o pai ouvia o rádio com máxima atenção. O pai, jogador de futebol profissional, dissera ao garoto que aquela era a mais importante partida da história do país. Uma final de Copa do Mundo disputada no Brasil, em que a seleção nacional, com seu glorioso uniforme branco, disputaria, favorita, a taça contra a celeste uruguaia. O menino, vendo a seriedade no semblante do pai, compreendia, na sua forma de criança, o quão relevante era aquele jogo de bola para os adultos; para seu pai, em especial. Apesar de continuar brincando, não deixava de atentar para as reações e humores do velho por um segundo sequer. Assim, sorriu quando o pai comemorou o gol da seleção, ficou apreensivo quando ocorreu o empate e arrasado quando um tal de Ghiggia marcou o tento da virada. Só não chorou como o pai, que foi às lágrimas quando o jogo acabou e o Brasil, apesar do favoritismo, de ter Zizinho e de jogar em casa, perdeu um Mundial que todos davam como ganho. Com um sorriso envergonhado, o menino se aproximou do pai e disse, amoroso:

- Não liga não, pai. Quando eu crescer, ganho um desse pro senhor.

Quando o Uruguai bateu o Brasil naquela final de Copa, o tal menino tinha apenas nove anos de idade. Oito anos depois, aos dezessete, participou da campanha brasileira na Suécia, quando nossa seleção, jogando ora de amarelo, ora de azul, conquistou seu primeiro título mundial. A partir de então, o Brasil tornou-se o maior vencedor de mundiais e o status de país do futebol; o tal menino tornou-se o rei desse esporte. E o Santos, o time que o revelou, até hoje é conhecido como o mais completo e vencedor clube enquanto Pelé desfilou seu imenso talento pelos gramados do país e do mundo.


O ano: 2003. O mesmo Santos, pela primeira vez após a despedida do seu maior astro, disputava uma final de Libertadores. Com o rei, conquistara dois títulos; o primeiro contra o Boca Juniors, da Argentina, e o segundo, contra o Peñarol, do Uruguai. Mas isso ocorrera há quase quarenta anos. Desta vez, o adversário era novamente o Boca, o mesmo da primeira conquista. Outros meninos brilhantes haviam surgido na Vila famosa, a confiança era total. Não obstante, os argentinos tinham vencido o primeiro jogo, lá, por dois a zero. Nada que não pudesse ser revertido na finalíssima, em casa. Entre tantos torcedores, um homem assistia à partida pela televisão, enquanto o filho de onze anos brincava ao lado. Sim, brincava, mas não deixava de observar a peleja, nem de reparar nas reações e humores do pai. Quando a partida acabou, percebeu que a derrota por três a um para os argentinos, com Robinho e tudo, arrancara, além de alguns xingamentos, uma lágrima do pai. E, docemente, tentou consolá-lo:

- Não liga não, pai. Quando eu crescer, ganho um desse pro senhor.

O pai sorriu, apesar da dor da derrota. Notara a semelhança com a história do outro menino. Só não podia imaginar que o consolo do filho não era mera coincidência, mas o destino novamente escrito pela boca e pelo talento de outro menino, o seu Junior. Oito anos depois, o Santos disputa novamente uma final de Libertadores, contra o Peñarol – sim, o mesmo do segundo título da América –, e ergue a taça pela terceira vez. Melhor: pela primeira, após a despedida do seu menino-rei dos gramados. Agora, o Junior é o novo menino-rei.

Eis as histórias de dois meninos que reverteram a história. Que, de certa forma, nos redimiram. De uma final melancólica, de derrota, reescreveram outra, vitoriosa, campeã. A história do menino Pelé ocorreu de verdade. Já a do menino Neymar... bem, nada há que prove a existência dos fatos relatados, pelo menos até a vitória contra os uruguaios, absolutamente verdadeira. E é isso o que importa: é verdade que esses meninos cresceram, viraram reis e trouxeram – e continuam trazendo –, com seu talento inigualável de tratar a bola, tantas alegrias e taças. E também é verdade que esses meninos nasceram e nascerão de tempos em tempos neste país. Meninos de favelas, de campinhos de várzea, de escolinhas. Meninos da Vila. Meninos do Brasil.

JFQ

Agora, quem dá bola na América



Santos 2x1 Peñarol
Santos campeão da Copa Santander Libertadores 2011

Rafael, um jovem e brilhante goleiro, com um futuro promissor. Danilo, também jovem, convocado para os times de base da seleção brasileira e, certamente, um jogador que vestirá a amarelinha principal no futuro próximo para atuar na lateral direita ou como volante. A dupla de zaga, a muralha praticamente intransponível: Edu Dracena, o capitão, e Durval, o cabra macho. Adriano, outro jovem talento, a princípio visto como um batedor, mas que evoluiu a bom marcador. Arouca, o elegante meio-campista, raro volante com categoria e inteligência – por falar em seleção, faz por merecer uma oportunidade. Léo e Elano: os representantes da geração de meninos da Vila precedente a esta, e que, apesar de já experientes, encaixaram-se perfeitamente nessa engrenagem vitoriosa. Zé Eduardo (ou Zé Love, para os íntimos... ou íntimas): o quase-matador, cuja movimentação na área adversária compensa a uruca na hora H de marcar o gol.



Por fim, eles, a dupla genial, esperança do futebol brasileiro em 2014: Ganso e Neymar. Aliás, “Ganso e Neymar” passou a ser uma expressão, uma mítica figura ludopédica, uma força futebolística, como a mágica linha de frente de outro Santos, o maior de todos. Quando o santista de hoje estufa o peito para falar “Ganso e Neymar” soa como uma atualização da consagrada “estrofe” repetida por seus pais e avôs: “Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe”. A continuidade dessa dupla já não interessa apenas aos santistas, mas a Mano Menezes, aos brasileiros e a quem aprecia o melhor do nosso futebol-arte-com-resultado.

Organizando tudo, o mestre Muricy Ramalho, que, a pretexto de trazer equilíbrio à equipe, trouxe a liderança que faltava, o comando de quase-pai, muito além da figura fria do estrategista.


Claro, não se pode esquecer dos demais jogadores que, de uma forma ou de outra, participaram dessa gloriosa campanha campeã: Jonathan, Pará, Alex Sandro, Alan Patrick, Bruno Rodrigo, Maikon Leite, Keirrison, dentre outros. Não se pode esquecer o presidente Luis Álvaro de Oliveira, que, a despeito da péssima imagem que têm os cartolas (não sem razão), mostra-se um inovador e um excepcional administrador do clube. Não se pode esquecer, ainda, daqueles que participaram da formação desse escrete tão vitorioso, desde há uns três anos, ora consolidado campeão de vários títulos: Dorival Jr., Wesley, André, Robinho...

Enfim, eis um time campeão, em uma fase esplendorosa, com (mais) uma geração de raros talentos. O tricampeonato da Libertadores fala por si, mas o brilho deste Santos não se resume a ela. Trata-se de um projeto em curso, que já soma dois paulistas, uma Copa do Brasil e agora, a América. No final do ano, quem sabe, contabilizará o maior de todos os títulos: o Mundial. Aí, caso não volte a zebra mazêmbica ou outra zebra qualquer, veremos, enfim, o embate que tanto se desejou de 2010 para cá: Xavi contra Ganso, Messi contra Neymar, Barça contra Peixe. Sim, não foi apenas o Santos que ganhou a América; é o mundo que está ganhando o que o futebol pode dar de melhor.

JFQ

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Milhões de detalhes levam à taça


José Roberto Torero


Este texto não é um. São dois. A primeira metade estou escrevendo no intervalo do jogo, no meio da torcida santista no Pacaembu (a ala dos jornalistas estava lotada). A segunda parte farei no fim do jogo.

Pois bem, após estes 48 primeiros minutos, minha conclusão, nada criativa, é que o jogo será definido por um detalhe. Digo isso não só pelo 0 a 0, mas principalmente pelo currículo dos clubes na fase de mata-mata.

Explico: o Santos sempre venceu seus oponentes por um e apenas um gol, somando-se os dois jogos.

Com o Peñarol deu-se a mesma coisa nas oitavas e nas quartas, e nas semis passou ainda com mais dificuldade, graças ao critério dos gols marcados fora de casa.

Ou seja, são dois times que sempre superam seus inimigos por pouco, que passam raspando sobre precipício, e hoje não há como ser diferente. Um detalhe, um lance fatal, uma jogada perfeita deve decidir o jogo.

Nestes primeiros minutos houve vários candidatos ao posto de jogada decisiva: dois chutes de Elano, um de Zé Love, uma grande chance de Léo e uma cabeçada de Durval. Da parte do Peñarol, houve belo chute cruzado.

Daqui a 45 minutos escreverei de novo. Talvez dizendo que minha tese foi perfeita, talvez dizendo que sou uma besta.

Fim do jogo. Sou uma besta. Não porque houve três gols, ou seja, três detalhes, mas porque pensei melhor e achei minha tese do lance decisivo uma bobagem.

Não foi o gol de Danilo que deu o campeonato ao Santos.

Foi também o tapinha salvador de Rafael, a saúde de Pará, os bicões de Durval, a cabeçada de Edu Dracena, a garra de Léo, a perna providencial de Adriano, a calma de Ganso, a eficiência de Elano, as boas antecipações de Arouca, o gol de Neymar, o suor de Zé Eduardo, a esperteza de Muricy. E todos os jogos e lances que fizeram o caminho do time até aqui, inclusive a conquista da Copa do Brasil.

Uma vitória não se faz apenas por um sim do time que vence, mas por vários nãos do time que perde. Os erros dos outros também contam.

São os milhões de detalhes que levam um time ao título. E o último gol, é claro, é o mais importante deles.

Agora, enquanto Pelé entra em campo, penso que ele foi o maior detalhe que já houve. Detalhe tão gigantesco que foi sempre uma sombra sobre o Santos. Mas agora não há mais sombra. O time de Neymar conseguiu a maior vitória da era pós-Pelé.

O Santos é o campeão da América do Sul. E isso não é um detalhe.
 
* Publicado na Folha de S.Paulo, em 23/06/2011.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Santos, tricampeão da Libertadores!


Em um jogo truncado, mas em que o Santos foi sempre superior ao Peñarol, o Peixe faturou o tricampeonato da Libertadores da América. O primeiro título pós-Pelé.

Parabéns, Santos! Campeão da Libertadores 2011.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Alguém explica?

Antero Greco

Como apaixonado por futebol, assim como você, preferia agora discutir o belo empate do Santos contra o Peñarol, anteontem, pela final da Libertadores. O time brasileiro ficou perto do tri, para honra de sua história gloriosa. Seria mais empolgante, também, falar do líder São Paulo, do vice-líder Corinthians e do imprevisível Palmeiras, ali entre os quatro.

Mas vou ser sincero: se na coluna de hoje eu me pusesse a abordar só a bola rolando, iria me sentir traidor. Isso mesmo: estaria a enganar a você e a mim. Na ordem natural das coisas, o mundo do futebol deveria girar em torno dos astros, dos treinadores, das polêmicas a respeito de quem é melhor, se o juiz errou ou com quem ficará o título. Era assim; agora não mais, infelizmente.

Por aqui, o esporte mais popular do mundo virou assunto de Estado e de interesse público, por causa dos preparativos para a Copa que a Fifa jogou no nosso colo. Não passa dia sem que sejamos surpreendidos por medidas que desafiam o bom senso e atingirão nosso bolso, em nome da boa organização do evento previsto para 2014.

Abro o Estado de ontem e vejo que é aprovada isenção de ISS para a Fifa, que já havia recebido outras benesses. O texto final carece de ajustes, mas o essencial está lá: a dona da Copa, que nem brasileira é, fica livre de imposto que toda empresa daqui paga. (Em São Paulo, todo mês religiosamente repasso 5% para a Prefeitura, sem perdão.)

Veja que curioso. A Fifa vira e mexe se zanga com algum governo que mete o bedelho na estrutura do futebol. Ela diz que isso é inadmissível, pois não se pode permitir que a política interfira no esporte. E pune o país em questão. Está certo que em geral ela propõe represálias para Confederações poderosas como as de Cochinchina, Longistão, Beleléu… O Brasil teve CPIs sobre futebol, há uma década, e não sofreu sanções.

Pois a Fifa apolítica, que celebrou um Mundial na Argentina sob ditadura sangrenta, dá seus pitacos em governos soberanos. Basta ver as exigências que faz de participação oficial para as Copas e as isenções fiscais que pede. Quer dizer, governo não pode intervir no futebol, mas a Fifa pode fazer com que estados deixem de arrecadar impostos.

Abro também a Folha de S. Paulo de quinta-feira e leio que o governo federal pretende manter sob sigilo os custos das obras para a Copa de 2014 e para os Jogos Olímpicos do Rio em 2016. Trocando em miúdos, é o seguinte: os gastos só serão fornecidos para órgãos competentes – os Tribunais de Contas –, quando o governo achar conveniente, e sob a condição de que não se tornarão públicos. Ficam fechados a sete chaves.

Dessa forma, não se saberá, por exemplo, se houve estouro em algum orçamento para esses eventos.

A alegação para a inclusão desse item na Medida Provisória 527 (que trata especificamente das duas competições) é a de que se corria risco de fraudes nas licitações. Agora, tudo se torna mais controlável. Também se diz que a constituição prevê sigilo, sempre que houver interesse do Estado e da sociedade.

Sei que assunto tão delicado foi estudado por gente muito mais preparada do que eu, que não passo de reles palpiteiro de esportes. Mas, preso à minha ignorância, me assaltam dúvidas. Uma delas: quanto mais transparentes forem as contas e as concorrências públicas, tanto melhor para todos? Ou não?

Não é de interesse da sociedade saber para onde vai seu dinheiro? Não é melhor para o governo escancarar o jogo, num momento em que as obras para a Copa despertam ceticismo no povo e nos deixam com um pé atrás? Não lutamos tanto contra censura e pelo estado democrático, justamente para debatermos com os governantes temas importantes para nossa vida? Já querem tornar eternos certos papéis oficiais. Agora, também os gastos para Copa e Olimpíada, que não são tão essenciais assim, ficarão trancados, longe de olhos curiosos?

Sei que é alta a probabilidade de estarmos a travar batalha perdida. Sei que são cada vez menos os órgãos de imprensa que se permitem fazer questionamentos. Sei que, à medida que se aproximar a Copa, com clima ufanista, serão vistos como chatos e antipatriotas Jucas, Trajanos, Calazans, Mauro Cézares, Salins e Malias da vida e outros que rechaçam o jornalismo chapa-branca. Mas esses, tanto quanto você e eu, são como o macaco Sócrates, do Planeta dos Homens, e candidamente afirmam: “Eu só queria entender”.

* Publicado em O Estado de S.Paulo, em 17/06/2011, e em http://blogs.estadao.com.br/antero-greco/2011/06/17/alguem-explica/ 

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Otimismo com canja de galinha



Peñarol 0x0 Santos
Copa Libertadores 2011


Confesso que achei a primeira partida da final da Libertadores menos emocionante do que esperava. Por culpa dos dois times. Não que tenha faltado aplicação dos jogadores. Faltou inspiração. E também coragem: as equipes, respeitando-se muito, não ousaram jogadas mais agudas, certamente receosas dos contragolpes. As jogadas de perigo saiam com muito custo e, no mais das vezes, não forçavam a que os goleiros Sosa ou Rafael fosse exigidos. O placar sem gols refletiu um pouco isso.

O empate, apesar de não valer o tal “gol qualificado” para a final – isto é, um empate com gols no Pacaembu não dará nenhuma vantagem ao Peñarol –, não é razão para otimismos exagerados. O time uruguaio pode, sim, senhor, sagrar-se campeão na casa do Santos. Como, inclusive, já mostrou ao Internacional, derrotado em pleno Beira-Rio. Há mesmo quem diga que o Peñarol joga melhor fora do que dentro de casa. Tem lógica: a equipe marca muito bem, usando as famosas duas linhas de quatro, e contra-ataca com rapidez, com Mier, Corujo e Martinuccio, sempre em busca do centroavante Olivera.

Em suma, o placar da primeira partida não é motivo suficiente para se alimentar otimismos exagerados. Por outro lado, o que pode fundamentar um otimismo moderado – com a precaução que exigem a humildade e a vocação ao inusitado característico do esporte bretão – é a superioridade técnica do Santos, com especialíssimo destaque a Neymar. Porém, o jovem talento da Vila precisa, mais do que nunca, superar a propensão às simulações de falta.

Ainda sobre a partida de ontem, há que se realçar a boa atuação dos reservas Bruno Rodrigo e Alex Sandro. Mostraram que, quando necessário, pode-se contar com eles. Entretanto, na partida da próxima quarta – a finalíssima –, o Peixe contará com força máxima. Retornam Jonathan, Léo, Edu Dracena e Paulo Henrique Ganso. Eis uma outra e excelente razão para mais um pouco de otimismo.

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O hipotireoidismo de Neymar


Ronaldo, ao anunciar sua aposentadoria, tentou calar os críticos de seu físico, digamos, rechonchudo, com a alegação de que sofria de hipotireoidismo. O Fenômeno, pagando de coitado, saiu com essa, asseverando que o tratamento para a doença requeria medicamentos que configurariam doping. O que foi prontamente rechaçado por especialistas.

Na véspera de sua partida de despedida pela seleção brasileira, no programa “Bem, Amigos!”, da SporTV, o mesmo Ronaldo, agora empresário, veio com mais essa: Neymar se joga muito porque pesa míseros 47 quilos, e qualquer entrada mais forte poderia causar-lhe lesões muito sérias. Então, tá. E o Messi, pesa quanto?

O novo empresário só deixou de dizer que a fama de cai-cai é um dos componentes negativos da imagem de Neymar a ser trabalhada pela 9ine, do mesmo Ronaldo, da qual o craque santista é cliente destacado.

É engraçado como tentar mudar a realidade é bem mais complicado do que moldar a imagem em torno da mesma realidade, falseando-a. Mas, quem sabe, talvez não seja tão eficaz, tão convincente aos “consumidores” dessa imagem, por mais competente que seja a 9ine ou outras agências do tipo. Talvez, só para variar, seja útil medidas outras, que não passam diretamente por ações de mídia, tais como, sei lá, fazer regime ou tentar permanecer em pé após as disputas de lances...

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Em tempo: não sei se Adriano – a contratação corinthiana que, segundo dizem, foi acertada por Ronaldo – também é cliente da 9ine. Mas, também no seu caso, talvez valha mais preservar-se um pouco das noitadas do que dar desculpas esfarrapadas à Patrícia Poeta ou outro jornalista desta ou daquela emissora de TV.

JFQ

quarta-feira, 15 de junho de 2011

A segunda revanche ou a terceira estrela



Copa Santander Libertadores da América 2011
Final: Peñarol x Santos


Hoje à noite, no legendário estádio Centenário, em Montevidéu, Peñarol e Santos fazem a primeira partida da final da Libertadores 2011. De um lado, o time bem organizado por Muricy Ramalho, contando com o brilho do craque Neymar. De outro, a não menos bem organizada equipe de Diego Aguirre, sob a liderança do inteligente Martinuccio.

Peñarol e Santos disputam a final do torneio pela segunda vez na história, tendo se encontrado em 1962, quando o Peixe faturou seu primeiro título. Para os supersticiosos santistas, o reencontro pode significar um bom ou um mau sinal, dependendo do ângulo... e do supersticioso. Pelo lado otimista, trata-se do reencontro de um adversário já vencido em outro momento. Pelo lado pessimista, assim como o Boca Juniors conseguiu, em 2003, vingar-se da derrota para o Santos em 1963 – ano do segundo título –, também pode ser agora o momento da revanche do Peñarol.

Afora a curiosidade de, nas quatro finais disputadas, o Santos fazer duas com o Boca e outras duas com o Peñarol, o que pesa na noite de hoje é a bola jogada em campo pelos atuais meninos da Vila. Disso, acima de tudo, depende se o Peixe sofrerá uma segunda revanche ou conquistará uma terceira estrela sul-americana.

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Os riscos e as oportunidades para o Peixe

Nessa primeira partida, o Santos terá importantes desfalques: Jonathan, Léo, Edu Dracena e Paulo Henrique Ganso. Apesar da arqui-conhecida condição de craque de Ganso, da experiência de Léo ou da força do lateral Jonathan, quiçá a ausência mais relevante – dadas as circunstâncias – seja do capitão Edu Dracena, expulso na partida contra o Cerro Porteño. Isso porque o Peñarol costuma aproveitar-se muito bem dos vacilos da defesa adversária, o que, em tese, ocorre com mais freqüência quando a dupla de zagueiros não está bem entrosada. Além disso, pode pesar ainda a falta da liderança de Dracena em momentos críticos da partida. Pelo menos, nada há que se falar da capacidade técnica do substituto, Bruno Rodrigo.

Quanto aos laterais, pesa a favor do Santos o fato de Pará e Alex Sandro já virem ocupando, respectivamente, os lados direito e esquerdo com considerável constância e eficiência. Já a falta de Ganso, mesmo sendo um jogador ímpar – inclusive para a seleção brasileira –, é compensada por um esquema tático mais cauteloso, adequado para um jogo fora de casa, sob grande pressão: um meio-campo com forte viés de marcação, com Adriano mais atrás e Arouca e Danilo servindo também como puxadores de contra-ataque. Elano na ligação, Neymar e Zé Eduardo à frente, é perigo permanente à defesa uruguaia.

O Peñarol joga com duas linhas de quatro, muito forte na marcação, mas que sai com bastante velocidade nos contra-ataques. As principais jogadas ofensivas do time são pelos lados, especialmente com Martinuccio, ou bolas alçadas na área, sempre em busca do oportunista Olivera. Em jogadas assim, o Peñarol construiu suas vitórias contra o Internacional, no Beira-Rio, e contra o Vélez Sarsfield, em Montevidéu.

Em compensação, apesar da boa marcação, a equipe de Diego Aguirre também mostra falhas na defesa. Evidência disso foi o primeiro jogo contra o Vélez, quando a equipe argentina desperdiçou várias chances seguidas, o que lhe custou uma possível vitória e, quiçá, a classificação para a final. Ou seja, o Santos tem por obrigação conferir o tento sempre que as oportunidades forem criadas, já que com o Peñarol o ditado “quem não faz, toma” é quase lei. Aliás, o próprio Peñarol também mostrou que não costuma ter piedade do adversário quando surgem as chances.

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Renascimento uruguaio

Independentemente da conquista da Libertadores, a chegada do Peñarol à final soma-se à boa campanha da seleção celeste na Copa de 2010 como mostras de renascimento de um gigante histórico do futebol sul-americano e mundial. Interessante notar que esse renascimento venha com uma certa mudança de estilo do tradicional futebol uruguaio. Da mesma forma que a seleção comandada por Tabaré Vasquez, a equipe de Diego Aguirre não bate tanto, não apela tanto para a violência, ainda que se notabilize pela forte marcação. Dessa forma, preocupando-se em jogar bola e não em intimidar o adversário, o Uruguai parece ter encontrado o caminho para retornar seu lugar histórico no centro do futebol mundial.

JFQ

terça-feira, 14 de junho de 2011

A esclarecedora entrevista de Mano Menezes

Bastante esclarecedora a entrevista de Mano Menezes ao programa “Bem, Amigos!”, comandado pelo cada vez mais pândego Galvão Bueno, ontem, na SporTV.

Entre os assuntos tratados pelo técnico da seleção brasileira, destacam-se a ausência de Marcelo e de Hernanes nas últimas convocações, a formação tática ideal e os esquemas opcionais.

Sobre Marcelo, Mano afirmou que reconhece sua grande qualidade e o ótimo momento no Real Madrid, e que sua ausência na lista da Copa América não se deve a qualquer rixa pessoal ou coisa que o valha. O técnico da seleção, aliás, disse que a função exige responsabilidade, o que não se coaduna com melindres a impedir a presença de um jogador de qualidade no time. A razão para que Marcelo não conste do elenco que vai à Argentina é a falta de compromisso com a camisa canarinho que Mano enxergou no seguinte fato: em convocação anterior, o lateral pediu para não ser chamado a fim de que tratasse de uma lesão; no entanto, teria chegado a Mano, por engano, um e-mail enviado por Marcelo ao Real, dizendo que conseguira se desvencilhar da seleção brasileira, no caso, para priorizar o clube naquele momento. O episódio, relatado por Galvão Bueno, não foi rechaçado pelo técnico da seleção. Porém, Mano disse compreender que existem fortes pressões exercidas pelos clubes, e afirmou não fechar as portas para Marcelo em convocações futuras.

Quanto a Hernanes, que fez uma ótima temporada de estreia na Itália, Mano negou que sua ausência nas últimas listas se deva à expulsão na partida contra a França. Para o treinador, Hernanes estava sendo convocado na condição de volante, mas passou a assumir a função de meia-atacante na Lazio, em esquema que não deve ser seguido na seleção. Ao mesmo tempo, outros jogadores passaram a se destacar na mesma posição de Hernanes (arrisco dois: Elano e Lucas).

Sobre o esquema tático ideal, Mano Menezes apontou que pretende jogar num 4-3-3 que, eventualmente, pode ser convertido em um 4-2-3-1, o esquema da moda na Copa de 2010. Imagina um volante central, mais fixo (no time de hoje: Lucas Leiva, titular; Sandro, reserva), e outro, que suba mais à frente (Ramirez, Elias); um meia-armador (P.H.Ganso, praticamente único); um meia-atacante ou ponta-de-lança (Robinho, Lucas); um segundo atacante ou “atacante de beirada”, como diz o próprio técnico (Neymar, Nilmar) e outro, de área ou centroavante (Pato, Fred).

Mano também afirmou que não vê Elano como um volante, mas como um meia – inclusive, desde os tempos do Santos, campeão brasileiro de 2002 –, assim como não enxerga Robinho fazendo a função de meia-armador. Também reconhece que Ganso é fundamental a seu esquema e, considerando suas seguidas contusões, imagina opções – um plano B e um plano C – com Jadson ou com Elano.

Enfim, o técnico da seleção foi bastante sincero e objetivo em suas respostas. Ficou mais clara sua proposta para o escrete canarinho. Se tudo isso dará resultados, contudo, o futuro é que dirá.

JFQ

O luto, a despedida


No último dia 12, morreu Adãozinho, ex-jogador do Corinthians, pelo qual atuou de 1971 a 1978. Adãozinho participou da famosa vitória sobre o Palmeiras, por 4 a 3, em um jogo eletrizante, em 71, quando marcou um golaço de fora da área. Adãozinho também integrou o elenco corinthiano no título de 1977. Jogou também no Coritiba e na Portuguesa.


No mesmo dia 12, após empate do Boca Juniors com o Banfield, por 1 a 1, no estádio de La Bombonera, em Buenos Aires, o atacante Palermo anunciou sua aposentadoria dos gramados. Palermo, o maior artilheiro da história do Boca, com 227 gols, fará apenas mais uma partida, contra o Gimnasia y Esgrima, na casa do adversário, no próximo final de semana.

JFQ

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Fenômeno Global

Ronaldo aposentou-se dos gramados e virou empresário. Galvão Bueno lançou o chiste: agora Ronaldo é Nazário, o empresário. É mesmo um pândego esse Galvão!

E não é que o empresário Nazário mostrou sua eficiência de cara! A tarefa de sua empresa, a 9ine, é gerenciar a carreira de atletas. O que significa, mais ou menos, manter o sujeito presente na mídia, sempre com uma imagem positiva, de modo a que possa associá-la a uma infinidade de produtos a serem vendidos. Camisas, loção pós-barba, forno microondas ou creme dental.

Apenas ontem, dois dos principais clientes do Fenômeno foram vistos em programas de grande audiência da Vênus Platinada. Lucas, jovem revelação do São Paulo, participou do Domingão do Faustão, no quadro “Dança dos Famosos” (tudo a ver!). Neymar deu uma entrevista – despretensiosa que só – a Patrícia Poeta, no Fantástico, em que “revelou” que será um pai zeloso, um homem responsável, e “esclareceu” que não é cai-cai. Aliás, tal pecha é muito ruim para os negócios, já que a imagem de simulador pega muito mal, especialmente na Europa, mercado onde, no futuro próximo, o “produto-Neymar” deve estar à venda. E, para que o produto fique ainda mais vendável e a ele se agregue valor, também não se perde tempo em martelar que “Neymar é o sucessor de Ronaldo”. Bom para ambas as partes: o sucessor e o antecessor.

O próprio Ronaldo foi figura vista e revista na telinha da Globo, neste esforço de marketing dominical. De manhã, após matéria sobre seu jogo de despedida na seleção, deu uma entrevista na sede da 9ine ao dileto locutor da emissora carioca, no quadro “Na estrada com Galvão”, do programa Esporte Espetacular. À noite, eis que surge no Fantástico para desejar felicidades a um casal de corinthianos, cuja história ilustrou matéria sobre o dia dos namorados.

Enfim, o domingo foi fenomenal para os negócios de Nazário. E revelador de como o futebol vai além das quatro linhas nestes novos tempos. Ou, talvez, esteja ficando atrás de outros propósitos, ora mais importantes, uma vez que mais rentáveis.

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A exploração do futebol para ações de marketing de todos os tipos também pode ser observada na nova moda da mesma Globo: a comemoração à la boneco João Sorrisão. Quem marca gol e faz uma comemoração desengonçada, ganha o boneco... e a emissora, claro, ganha uma propagandazinha disfarçada em vários jogos.

João Sorrisão não é lá muito original. Na verdade, é uma espécie de sucessor da dança do siri e do “Ah, moleque”, ambos lançados pelo programa Pânico, da Rede TV!

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Em suma, nada mais é inocente no comportamento dos jogadores, em campo ou fora dele. Tudo tem uma conotação imagética e comercial. Tudo vira produto intangível, como dizem os especialistas, dotado de valor comercial.

E a bola jogada de fato, ainda que não seja tão redonda, passa a segundo plano. Afinal, na ausência de um Ronaldo em campo, chame-se o Nazário: oxalá, ele poderá até fazer com que o perna-de-pau seja vendido como se craque fosse. Esse Nazário é mesmo um fenômeno!

JFQ

Lições da Série B

Antero Greco


Você gosta de ver seu time na Segunda Divisão? Não?! Nem eu. É uma aporrinhação, um sofrimento só passar alguma temporada no purgatório do futebol. Sem contar a gozação dos outros. Dá raiva. Mas desgraças acontecem, e muito clube de história respeitável já amargou essa humilhação, na maioria das vezes por incompetência, dentro e fora de campo.

A expiação pode lavar a alma, advertiriam os profetas da autoajuda. Não vou fazer a apologia da queda para a Série B. Só que, aproveitada com critério, a experiência azeda vira base sólida para reação e sucesso. Duvida? Dê uma olhada na lista de pesos pesados que frequentaram o andar de baixo da bola e constate como vários depois se saíram bem.

Exemplos mais recentes são Vasco e Coritiba, que anteontem decidiram a Copa do Brasil. A propósito: foi um jogaço, do ponto de vista da emoção. Tecnicamente, não se mostrou nenhuma maravilha. No entanto, não faltou adrenalina. Um hora o Vasco aumentava a diferença, noutra o Coritiba descontava, virava, ficava em vantagem e dava esperança ao torcedor de que chegaria ao título. Que, no final, foi para São Januário.

Pois bem. As duas equipes padeceram, até pouco tempo atrás, a penúria da divisão de Acesso. O Vasco jogou a Segundona em 2009 e o Coritiba esteve lá no ano passado. O clube carioca já se garantiu para a Libertadores de 2012, enquanto ao bravo Coxa restam o consolo do ressurgimento e a perspectiva de um proveitoso regresso à Série A.

Pode não parecer muito, mas é. O sacrifício de brigar para retornar à elite provoca uma corrente positiva em torno do time. Torcedores vão ao estádio (lembram como Palmeiras, Corinthians e Grêmio jogavam com lotação total?), jogadores se sentem mais próximos, a solidariedade se acentua. Camaradagem e entrosamento são transferidos para a Primeira Divisão. Há casos, até, em que o prejuízo financeiro fica aquém do temido num momento inicial.

O importante é aprender - e isso parece que Vasco e Coritiba fizeram. Como ocorreu com o Grêmio, por exemplo. Os gaúchos circularam pela Série B em 2005 e voltaram no ano seguinte. Precavidos e práticos. Resultado: três títulos estaduais (2006, 07 e 10), o vice na Libertadores de 2007, fora boas colocações no torneio nacional (3.º em 2006, vice em 2008 e 4º em 2010). Nada mau.

O Corinthians também acordou, depois de purgar os pecados em 2008. Na temporada subsequente ganhou o Paulista e a Copa do Brasil, voltou à Libertadores em 2010. Nesse meio-tempo, trouxe Ronaldo, investiu em ações de marketing e agora até estádio terá. O Palmeiras foi campeão da Série B em 2003, para ficar em 4.º nos Brasileiros de 2004, 2005 e 2008. Em 5.º em 2009.

A reconstrução em geral se faz com elenco menos vistoso. Mesmo assim, há lucro. O Grêmio faturou com Anderson, um dos heróis da Batalha dos Aflitos, o Palmeiras ganhou boa grana com Vagner Love, o Corinthians encheu os cofres ao vender, em penca, Cristian, Douglas e André Santos. O segredo para evitar depressão é agir rápido. Clubes com currículo valioso também não devem ficar mais do que um ano na boca de espera. Dali pra frente, a tendência é a de desestabilizar e de aumentar o sofrimento. Bahia, Portuguesa, Guarani estão aí para não me desmentir.

De volta ao Vasco. A proeza de Fernando Prass, Felipe, Diego Souza, Éder Luís & Cia. tem valor prático - um troféu e vaga em competição sul-americana. Ótimo. Mas sobretudo carrega significado simbólico relevante. O clube enterra a era Eurico Miranda, dá um bico no fantasma de um cartola que o comandou por décadas e que representa o que há de mais ultrapassado em administração.

Seus simpatizantes, cada vez em número menor, esfregavam as mãos com as cabeçadas de Roberto Dinamite e estavam de butuca para retomar o poder, sobretudo quando houve o rebaixamento. O ex-presidente era endeusado, como a única solução para os males que acometiam o clube. Mazelas desenvolvidas em anos de atraso. Agora, com a Copa do Brasil jeitosamente acomodada na sala de troféus, quem sabe não sepultam de vez a memória desse personagem? É mais do que hora de virar página e fechar espaço para caudilhos, salvadores da pátria, coronéis da bola.

Ainda há vários espalhados por aí, eu sei. Alguns inclusive falam grosso até com governos. Mas um dia caem. Ah, caem! É lei da vida. Vou esperar.

* Publicado em O Estado de S.Paulo, em 10/06/2011.

Avante, paulistas!



Disputadas quatro rodadas do Brasileirão 2011, os paulistas começam a se destacar. O chamado trio de ferro ocupa as primeiras colocações na tabela.

O São Paulo, líder, tem 100% de aproveitamento. Além disso, a novidade de um time mais ofensivo pelas mãos de Carpegiani. Aos poucos, o volante Wellington acertou-se como titular intocável, para azar de Carlinhos Paraíba e Rodrigo Souto. Juntamente com Casemiro – o volante artilheiro –, e com a aceitação do treinador em jogar eventualmente com Lucas e Marlos juntos, o meio campo do Tricolor ficou mais leve e rápido. Destaque-se, ainda, a alternância em jogar com dois ou três zagueiros, dependendo da circunstância da partida. Na partida contra o Grêmio, além da vitória por 3 a 1, o São Paulo mostrou bom futebol, envolvente, e deu sinais inequívocos de que é forte candidato a mais um título. Detalhe: o time do Morumbi ainda não conta com Luis Fabiano, o que, em tese, lhe dará ainda mais força no ataque.

Já o Corinthians, invicto – um empate e três vitórias –, também dá sinais de mudança no padrão de jogo. Tite, enfim, parece ter conseguido imprimir à equipe uma filosofia de jogo que prima pela marcação forte e adiantada, levando a roubadas de bola e ataques fulminantes. Não apenas contra o Fluminense – que ficou à mercê do domínio corinthiano durante o primeiro tempo, mas conseguiu reverter a situação no segundo, só não chegando ao gol graças à boa atuação de Júlio César –, mas também contra o Flamengo, o Timão mostrou seu novo jeito de jogar. Destaque para Liedson e, principalmente, Willian, impiedosos marcadores das saídas adversárias e perigosos finalizadores quando tomam a bola. Ressalte-se também as boas atuações dos novos contratados, o atacante Emerson e o lateral Welder, além de que o clube fez outras ótimas contratações que ainda não entraram em campo: o goleiro Renan e o meia Alex. No caso de Adriano... bem, ainda não se sabe se o ex-Imperador será um pró ou um contra ao Timão.

O Palmeiras, terceiro colocado, muito embora não gere as mesmas promissoras expectativas que os arquirrivais, começou muito bem o certame. Prova disso foi o empate contra o poderoso Internacional, por 2 a 2, em pleno Beira-Rio. A ascensão palmeirense, no entanto, depende muito da contratação de reforços ou, pelo menos, do retorno – em boas condições – de se maior craque: Valdívia.

Até mesmo o Santos, em que pese estar apenas na décima terceira colocação, merece ser lembrado. Afinal, jogar com o time reserva, com a cabeça totalmente voltada para as finais da Libertadores, e empatar com o tão falado Cruzeiro, em plena Arena do Jacaré, é prova de que a equipe, daqui a pouco, estará firme na disputa pela ponta.

Enfim, é muito, muito cedo para se prever qualquer coisa, mas, se persistir a tendência inicial, a hegemonia paulista no mais importante campeonato nacional tem tudo para ser resgatada, após dois anos consecutivos de conquistas cariocas.

JFQ

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Heroico



Não apenas o navegante português que lhe dá nome, mas a saga do clube nos últimos anos pode ser considerada heroica. Como foi heroica a conquista da Copa do Brasil pelo Vasco, em um jogaço contra o não menos heroico Coritiba.

A partida foi de matar do coração as sofridas torcidas cruzmaltina e coxa branca, além de, no mínimo, provocar alguma taquicardia naqueles que nada têm a ver com um ou com outro finalista.

Em um estádio Couto Pereira lotado e efervescente, o Coritiba, muito bem comandado por Marcelo Oliveira, tratou de partir logo para cima. A vitória vascaína no primeiro jogo, por 1 a 0, impunha-lhe a obrigação de vencer. Pior: em caso de gol do adversário, como não tinha feito nenhum tento em São Januário, obrigava-lhe a vitória por dois gols de diferença. Como nestes tempos sofrimento pouco é bobagem para o Coxa, o Vasco acertou um contra-ataque aos 12 minutos do primeiro tempo que culminou no gol de Alecsandro... justamente o filho de Lela, um dos heróis coritibanos na conquista do Brasileirão de 85.

Enganou-se, porém, os precipitados (geralmente, enquadro-me neles) que sentenciam de pronto: será impossível a equipe paranaense marcar três. Marcelo Oliveira tirou o volante Marcos Paulo e colocou o atacante Leonardo. O fato é que o Coritiba começou a se acertar em campo – o time estava bastante nervoso – e a bola começou a chegar à meta do ótimo goleiro Fernando Prass com frequência considerável. Com um ataque mais intenso – para usar um jargão “mano-menezesco” –, composto também pelos ligeiros Rafinha e Davi, além do oportunista Bill, este mesmo, aos 30 minutos, completou cruzamento de cabeça para empatar a partida. Na base do não para, não para, não para, aos 45, Davi acertou um tirombaço no ângulo: Coritiba, 2 a 1.

O segundo tempo começou com o Coxa precisando de apenas um golzinho para o título. E foi para cima. O Vasco oscilava momentos de impotência com outros, poucos, de contra-ataques bem produzidos, sempre pelos pés do rápido Éder Luis. Felipe e Diego Souza, os responsáveis por prender a bola e conter o ímpeto coritibano, não estavam conseguindo fazê-lo eficientemente. Mas, em jogada individual de Éder Luis, aos 13 da segunda etapa, um chute forte e com efeito, mas de muito longe e no meio do gol, terminou na falha (frango?) do goleiro Edson Bastos e em novo empate vascaíno. Novamente, o Coxa precisava marcar dois gols.

O que parecia mais uma vez impossível, passou a ser nova esperança quando, aos 21, Willian acertou um lindo chute – algo frequente neste jogaço – que fez a bola morrer no ângulo da meta de Prass. Daí para frente foi só pressão coritibana, resistência vascaína – Diego Souza e Felipe, substituídos, ficaram rezando no banco de reservas – e muita luta de lado a lado para a conquista de um título inédito e vaga na Libertadores do ano que vem. Tal conquista, enfim, coube ao Vasco da Gama, muito bem treinado por Ricardo Gomes, quando o árbitro Sálvio Spínola apitou o final da partida.

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O triplo renascimento do Vasco da Gama


A conquista da Copa do Brasil de 2011 pelo clube de São Januário marca um triplo renascimento deste que, indubitavelmente, é um dos grandes escudos do futebol brasileiro.

O primeiro, de curto prazo, é o da equipe que começou o ano marcado por um péssimo início de campeonato carioca. A mudança começou a partir da vinda de Ricardo Gomes, treinador contestado após passagens pela seleção brasileira olímpica e pelo São Paulo – onde, é bom lembrar, chegou perto de conquistar o Brasileirão de 2009. Gomes, aos poucos, acertou a equipe, montando uma defesa mais consistente com Allan e Ramon nas laterais, Anderson Martins e o bom Dedé na zaga, além dos volantes Rômulo e Eduardo Costa (com inegável estilo brucutu, mas sempre presente na marcação). Para completar, a criação e ataque composto pelo veterano Felipe, o habilidoso Diego Souza, o ligeiro Éder Luis e o artilheiro Alecsandro. Com este elenco, o Vasco chegou às finais da Taça Rio e à conquista da Copa do Brasil.

O segundo renascimento é justamente do time acostumado a títulos importantes. Quem viu a fase de fins dos anos 90, começo dos 2000, sabe que a camisa vascaína não combina com derrotas, mas com conquistas. A imagem de equipe campeã foi manchada pelo rebaixamento, em 2008 – o que também ocorreu com outros grandes nos últimos tempos –, e com a ausência prolongada de títulos de peso (o último que assim pode ser considerado foi a Taça João Havelange, o Brasileirão de 2000). A conquista da Copa do Brasil e a consequente vaga na Libertadores recolocam o Vasco em seu devido lugar.

O último renascimento é político. Após brava luta, o clube conseguiu se ver livre do comando do cartolão Eurico Miranda. No entanto, em que pese a imagem de prepotência e condução por meios escusos, pesava a favor de Miranda dirigir um clube vencedor. Roberto Dinamite, para muitos vascaínos, o maior ídolo de todos os tempos do clube, acima de Edmundo e Romário, assumiu a presidência com a missão de fazer do Vasco um clube administrativamente limpo e vencedor nos gramados. Neste último quesito, a vitória de ontem foi fundamental.

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Aplausos ao bravíssimo Coxa


A trajetória do Coritiba, mesmo perdendo o título, não foi menos heroica que a do Vasco da Gama. O Coxa, rebaixado no Brasileirão de 2009 – pela segunda vez em poucos anos –, está fazendo de 2011 um ano histórico. Campeão brasileiro da segundona, retorna ao Brasileirão após campanha sensacional: o Coritiba manteve invencibilidade de 29 jogos, sendo 24 vitórias consecutivas, recorde mundial.

A conquista da Copa do Brasil selaria essa trajetória fantástica de renascimento, o que, a bem da verdade, não deixou de ocorrer com o vice-campeonato.

JFQ

Nem brilhante, nem timinho: seleção em formação


Arrisco-me a ser execrado, mas não comungo das vaias e dos gritos de “timinho” alçados contra a seleção brasileira nas partidas contra a Holanda, em Goiânia, e contra a Romênia, em São Paulo.

É certo que o escrete canarinho não foi brilhante, mas também não se lhe pode impingir a pecha de timinho. Na verdade, ainda é um time em formação, passível de testes e sem o entrosamento mínimo desejado. Este, aliás, só virá com a definição de um elenco razoavelmente fixo de titulares – algo ainda mais complicado, dadas as seguidas contusões de Paulo Henrique Ganso, uma “peça” fundamental no esquema de Mano Menezes –, que jogue seguidas vezes.

Vale lembrar que as partidas contra a Holanda e a Romênia foram apenas as sétima e oitavas partidas do Brasil sob o comando de Mano Menezes. Talvez seja também o caso de lembrar aos que pedem a cabeça de Mano Menezes e, especialmente, àqueles que pensam que o Brasil, por ser o único pentacampeão mundial, tem a obrigação de jogar bonito e vencer – até mesmo, de goleada! – contra todos e em quaisquer circunstâncias, que a seleção de Dunga foi absolutamente vencedora nos anos que antecederam à Copa de 2010. É essa a referência de seleção que a torcida brasileira almeja no momento?

Na partida contra a Holanda, Mano colocou os jogadores que, dadas as últimas convocações, compõem o elenco principal, com as ausências dos lesionados Alexandre Pato e P.H. Ganso. O adversário, é sempre bom lembrar, é o vice-campeão mundial – o mesmo que eliminou o Brasil na África do Sul –, que, sob o comando de Bert van Marwijk perdeu apenas duas partidas em 38 jogos, sem uma delas a final da Copa! Destaque-se, ainda, que a Holanda está à frente do Brasil no ranking da FIFA e que, apesar da ausência de Sneijder – na minha opinião, menos importante a esta azeitada versão da Laranja Mecânica do que Ganso ao incipiente selecionado brasileiro –, contava com tudo o que tem de melhor, inclusive o perigosíssimo trio de atacantes, Kuyt, Van Persie e Robben. Em suma, o Brasil não tinha obrigação de vencer – como gostam de vociferar certos comentaristas –, mas de jogar bem. E o fez, sendo o placar de 0 a 0 justo e não condizente às boas chances criadas pelas equipes.

O Brasil criou pouco na primeira etapa e teve dificuldades em conter as investidas do jovem Affelay, que quase abriu o placar, não fosse a ótima intervenção de Júlio César. No segundo tempo, porém, o Brasil se acertou e chegou a esboçar um jogo envolvente, com rápidas e certeiras trocas de passes. Mas isso foi abortado pela entrada violenta e expulsão de Ramirez, em má fase: vem chegando atrasado aos lances, acertando com freqüência o adversário. Daí para frente, o Brasil parou de atacar, mas conseguiu conter a subida da Holanda.

Na partida contra a Romênia, a avaliação do time de Mano passa por duas ponderações: o técnico usou a partida para testar jogadores, em tese, reservas, e se tratava de um jogo de festa para a despedida de Ronaldo. De qualquer forma, a seleção esboçou jogadas de ataque, ainda que com excessiva procura de Neymar e dificuldade para finalizar. Mas o teste serviu para dar ao técnico confiança em relação a jogadores contestados como Jadson e Fred. Lembrando: contestados e reservas.

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O perfil da seleção de Mano

Após oito partidas sob seu comando, começar a ficar claro o perfil da seleção pretendido por Mano Menezes. Assim como alguns jogadores de sua confiança para preencher as respectivas funções em campo.

O time joga em um 4-4-2, que pode se tornar um 4-3-3, dependendo de como Robinho atue: mais recuado ou mais avançado. Aliás, um esquema muito parecido com o Corinthians de Mano, com destaque para o “meia cerebral” e o “centroavante referência”, no caso, Douglas e Ronaldo.

Os laterais – Daniel Alves e André Santos são titularíssimos – jogam como alas, sem abdicar do dever de marcar.

Quanto aos volantes, Mano gosta de um mais fixo, que jogue mais próximo aos zagueiros – Lucas Leiva é titular certo nesta função; Sandro é o reserva –, e outro, mais leve e que jogue mais à frente. Os volantes, ainda, não devem ter o “estilo botinada” (digamos, à la Felipe Melo), mas devem “mordem” o tempo todo, cercar o espaço do armador adversário, além de saber sair jogando e/ou até chegar eventualmente como jogador de ataque para uma finalização surpresa. Para a função de segundo volante, Ramirez, até então titular, pode perder a predileção do técnico, para alegria de Elias.

O problema de Mano está mais à frente. O “meia cerebral”, articulador, capaz de organizar e distribuir as jogadas de ataque e ditar o ritmo da equipe – enfim, o craque, o camisa 10 da seleção – parece ser o maior de todos os desejos de Mano Menezes. Contudo, para essas características, Paulo Henrique Ganso parece ser candidato único. Todos os demais possíveis candidatos – Jadson, Douglas, Thiago Neves, dentre os já testados – são meros espectros desse jogador. Até mesmo Robinho, Elano e Hernanes já tentaram cumprir esse papel, sem a qualidade vislumbrada em Ganso.

No ataque, Mano gosta de jogar com um centroavante referência – cujo nome do titular ainda não foi consolidado, com ligeira vantagem para Pato – e um ou dois jogadores rápidos e bem abertos pelos lados. Esta função é muito bem cumprida por Neymar, que, na ausência de um outro atacante com características similares, também joga no estilo limpador de pára-brisas – ora na direita, ora na esquerda –, fazendo lembrar, mutatis mutandis, Bebeto na Copa de 1994. Mas também pode ficar apenas pelo lado esquerdo, ficando Robinho pela direita ou outro atacante rápido, como Lucas, do São Paulo, ou Nilmar.

Enfim, esquema, filosofia de jogo ou expressões congêneres, há. Só que em tese. Falta, na prática, consolidá-los. O que virá ao longo dos jogos, assim como o tal entrosamento.

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Mano não é “dunguista”


Mano Menezes pode ser criticado por várias coisas, menos de ser “dunguista”. Em outras palavras, não tem apreço desmedido por volantões ou por avançar apenas em contra-ataques e não convoca seus jogadores por “comprometimento”.

No que diz respeito a suas convocações, inclusive a último, para a Copa América, ainda que se discorde deste ou daquele nome, foi chamado o que há de melhor no momento. Aliás, para os que pedem a cabeça de Mano, correndo novo risco de críticas severas, também não vejo ninguém muito melhor para comandar a seleção brasileira.

Às portas da Copa América, a um ano das Olimpíadas de Londres e a três da Copa do Mundo, talvez o melhor mantra seja este: paciência e persistência.

JFQ

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Convocação para a Copa América

Goleiros

Julio César (Inter de Milão)
Victor (Grêmio)

Laterais

Daniel Alves (Barcelona)
Maicon (Inter de Milão)
André Santos (Fenerbahçe)
Adriano (Barcelona)

Zagueiros

Lúcio (Inter de Milão)
David Luiz (Chelsea)
Luisão (Benfica)
Thiago Silva (Milan)

Volantes

Ramires (Chelsea)
Lucas Leiva (Liverpool)
Sandro (Tottenham)
Elias (Atlético de Madri)

Meias

Elano (Santos)
Paulo Henrique Ganso (Santos)
Jadson (Shakhtar Donetsk)
Lucas (São Paulo)

Atacantes

Neymar (Santos)
Robinho (Milan)
Fred (Fluminense)
Alexandre Pato (Milan)