quinta-feira, 9 de junho de 2011

O 10, o 9 e o penta

Daniel Piza

Quem viu o jogo da seleção contra a Holanda no sábado e algum da rodada do Brasileirão no domingo, como Flamengo x Corinthians, sentiu falta de dois personagens que fizeram a glória do futebol brasileiro no passado: grandes jogadores com as camisas 10 e 9. A carência de um meia e um centroavante criativos – a carência de criatividade em geral – é tão grande que todas as esperanças de um craque com a 10 recaem sobre Paulo Henrique Ganso, ainda se recuperando de lesão, e as de um craque com a 9 se dividem timidamente entre nomes como Pato, também ausente da seleção por lesão, e outros que estão igualmente longe de inspirar a confiança que Ganso inspira.

A seleção, como boa parte dos times nacionais, vive de volantes que sabem apoiar com velocidade, como Ramires (ou Hernanes, que merece ser chamado de volta), e jogadores de ataque que assumem apenas parcialmente a responsabilidade do último passe, como um Robinho mais e mais burocrático, ou do gol decisivo, como Neymar tem assumido no Santos. Agora pense na seleção campeã de 2002: a 10 era de Rivaldo, que passava e finalizava bem, e a 9 era de Ronaldo, que dispensa sínteses – e ainda por cima tinha Ronaldinho Gaúcho para ligar meio e ataque. Ganso e Neymar podem chegar a esse patamar, mas não sei se Pato ou Damião vão estar à altura. Fred raramente brilha.

Há um equívoco reinante a respeito do que é ser um 10. Hoje muita gente parece pensar que é o jogador que cadencia e organiza, como um Douglas ou o Alex ex-Palmeiras ou o próprio Ganso. Mas os grandes portadores do número gostavam de fazer gols, como Pelé, um ponta de lança que entrava sempre na área e fazia gol em quase todo jogo. Mesmo Maradona, mais lento e recuado que Pelé, tinha média superior a 0,5 gol por jogo e fez alguns antológicos, como se sabe. Messi é um 10 mais parecido com Pelé, por sinal, tanto que o Barcelona abre os outros dois atacantes, Villa e Pedro, para dar espaço para ele ziguezaguear entre os zagueiros e definir o placar. Zico era assim também.

Ganso sabe fazer gols, mas não faz muitos; como não tem muita velocidade, joga mais como um Zidane, atrás da linha de atacantes, distribuindo o jogo com sua visão e classe privilegiadas. Neymar não é nem um 10 nem um 9. Está mais para um segundo atacante, que tem gostado cada vez de atuar mais pela esquerda, de onde pode entortar os zagueiros e trazer para a finalização cruzada de direita, e se tornado cada vez mais conciso nessa execução, à la Romário. Já Lucas, que aposta mais ainda no arranque com bola dominada, precisa evoluir como finalizador e passador.

Então temos de entender que, apesar de não ter os típicos 10 e 9 que fizeram a lenda do nosso futebol, o Brasil não pode reclamar do time potencial que tem no momento. Mas muito trabalho será necessário para ter – se for o caso – um “losango”, como se diz, formado por Ganso, Lucas, Neymar e Pato, sem deixar o time fraco na marcação. A Copa América, em julho, será o primeiro grande ensaio para Mano Menezes mostrar que isso é possível, desde que cada um desses jovens talentos se comprometa a dialogar com os outros.

FENÒMENO

Quando Rivaldo voltou ao futebol brasileiro, muitos disseram que ele estava “magrinho” e portanto teria tudo para mandar muito bem. Quando Ronaldinho voltou, lembraram que com apenas 30 anos e uma torcida como a do Flamengo ele também teria tudo para voltar a ser um craque. Descendo um degrau, houve muita gente que disse que Liédson, o “levinho”, faria os gols decisivos do time. O alvo desses comentários, claro, era Ronaldo e seu peso.

Bem, dois anos depois de ele dar ao Corinthians dois títulos em três meses, como protagonista e autor de belos gols, cadê a comparação? Rivaldo e Ronaldinho não fizeram nem um décimo por seus times do que o “gordo” fez pelo Corinthians. Ontem foi sua festa de despedida, contra a Romênia, e todo esse vácuo ficou mais claro do que nunca. Ele desperdiçou três finalizações, mas isso bastou para todo mundo lembrar como fazia a diferença. Adeus, Fenômeno!

* Publicado em O Estado de S.Paulo, em 08/06/2011.

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