sábado, 10 de abril de 2010

O Santos e a inveja do pênis

O texto abaixo, publicado na Folha do S.Paulo em 9/4 último, é de autoria do ótimo cearense com aura de pernambucano Xico Sá. Independentemente da torcida, se para o Santos ou para o São Paulo, ou, como diria o próprio autor, sendo você torcedor ou secador, o artigo merece ser lido. Especialmente se você é apreciador do bom futebol.
JFQ

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O Santos e a inveja do pênis
Xico Sá


Amigo torcedor, amigo secador, que importa um campeão oficial, um campeão moral ou um campeão da superação espartana se já temos um campeão estético, festivo, dionisíaco e declaradamente mais genial há várias rodadas do torneio bandeirantes?
Nada.
A alegria, me sopra aqui do seu cadilac verde o velho Oswald, rumo aos Campos Elíseos, continua sendo a prova dos nove. O que o São Paulo, o Barueri prudentino e o Santo André terão a dizer para as novas gerações se conquistarem o caneco?
Nécaras. Apenas que valorizaram seus passes, alguns boleiros foram bem vendidos, combateram o bom combate, isso é lindo, aplausos. Na falta de requinte é o que resta, o miserável tédio de resultados. É o que terão a dizer, peito estufado, como lastro moral para a mídia que resolveu chamar o Santos de ""time da moda", a forma mais preconceituosa de negação do futebol bonito.
Todo mundo se acostumou tanto com os brucutus que a beleza ficou circunscrita ao modismo, a uma eventualidade, a um surto, como se fosse uma dengue ludopédica.
Triste, doloroso, mas o jornalismo hoje é tão retranqueiro como os Lazaronis da existência. Aí vem o baixinho Messi, do Santos da Catalunha, e desmancha o pragmatismo; aí vem o Neymar, do Barça da Baixada, e devolve, pelo inesperado, o medo do goleiro diante da vida. Se bem que é o Ganso o gênio deveras do time, que lembra o Clodoaldo no combate, que recorda o Gerson nos passes longos, que chega como um Tostão para o carrinho apenas diante das redes, que tem a elegância paraense do conterrâneo Sócrates Brasileiro, que fica feliz quando bota o André na frente do crime, que tem gosto pelo jogo na sua inteireza.
Sim, amigo, você está certo, o Peixe já ganhou o certame da aldeia, dez pontos na frente do segundo, mas a vida é mata-mata, vale a arena romana, cada lugar e hora um regulamento. Mas é óbvio que o alvinegro, clamo, repetirá as goleadas. Os meninos, que cometeram um único pecado grave neste ano, no episódio da ajuda ao Lar Espírita Mensageiros da Luz, terão o perdão do xará Chico Xavier, naturalmente, tomara!
Seria muito castigo. Não obrigatoriamente para os santistas, mas para quem, de todas as cores, aprecia o fino da bola. Voltaria toda aquela ladainha de que espetáculo não ganha jogo etc. Porre! Uma baita redenção dos conservadores, dos que preferem perder jogando feio a correr o risco da promessa de felicidade que se constitui na beleza.
Não quero ouvir as risadas cretinas dos cavaleiros das mesas-redondas contra essa bela turma praiana. Prefiro as gargalhadas ingênuas dos vossos dentes de leite a todos os sorrisos artificiais da TV brasileira. Faz cara feia, cowboy Durval, renegado herói do bravo Sport, e segura essa zaga. Porque é bom lembrar dos cavaleiros solitários que garantem a porta do saloon alvinegro para que os meninos façam a farra lá dentro.
O bom é que, de repente, até mesmo quem tirava onda do Paulistinha, os viciados na Libertadores, tomaram gosto pelo torneio. O Corinthians conseguiu fazer cinco, e até o São Paulo jogou bonito. O Santos despertou a boa inveja do pênis da qual falava o doutor Freud. Futebol é penetração e arte.

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