quinta-feira, 17 de março de 2011

Os donos da bola

Rita Siza


Pode ser que eu tenha estado distraída, mas ainda não ouvi o mundo do futebol exaltar-se, indignado pelos favores prestados ao clã Gaddafi ou por ver o seu bom nome manchado pela associação ao vergonhoso regime líbio.

O presidente da London School of Economics, pressionado pelos alunos daquela prestigiada universidade britânica, demitiu-se para proteger a reputação da instituição, que montara um programa de estudos com o dinheiro que lhe chegava da Líbia.

Várias superestrelas da música, como Beyoncé, Mariah Carey, Nelly Furtado e Jon Bon Jovi, envergonhadas e arrependidas de aceitar cachês milionários para atuar para os amigos do ditador, devolveram o dinheiro, sob a forma de donativos, para organizações de defesa dos direitos humanos.

Pode-se argumentar que não foi só agora, de repente, que o regime de Gaddafi se tornou insuportável, e que toda esta gente deveria ter consciência da sua brutalidade. Mas, apesar de mais tarde do que mais cedo, esta dor na consciência fica-lhes bem, ainda mais porque vai beneficiar milhares de vítimas inocentes e indefesas, na Líbia e noutras regiões deste mundo.

Mas a gente do futebol permanece calada e quieta. Aqui, o dinheiro do regime líbio não escalda ninguém.

Compreende-se: é um meio habituado a lidar com dinheiro proveniente dos carácteres e das fontes mais duvidosas sem o mínimo prurido moral. Um porta-voz da Juventus até considerou que os Gaddafi eram uns "investidores exemplares". Desde 2002 que a Líbia tem comprado acções do clube. Atualmente, é detentora de uma participação de 7,5% do capital e de um lugar na administração.

Mas não só a Juventus se beneficiou do dinheiro do regime: quatro outras equipas da Série A, Lazio, Perugia, Udinese e Sampdoria, foram pagas pela Líbia para ter Saadi al-Gaddafi, o terceiro filho do coronel Muammar, a treinar com os seus times. E, na Itália, o fundo soberano da Líbia é ainda um dos accionistas de referência do Unicredit, o maior banco do país, que é dono da AC Roma.

As organizações que gerem o futebol, particularmente a Uefa, continuam alegremente a ignorar o assunto, ao mesmo tempo em que a Líbia continua a bombardear suas cidades e a matar sua população. É inadmissível e mais um triste sinal de que esta gente habita um universo paralelo.

Se as instituições do futebol não se juntarem aos líderes internacionais que condenam a atuação do governo da Líbia e exigem a saída de Gaddafi, serão para sempre coniventes com os crimes contra a humanidade em curso no país africano.
 
* Publicado na Folha de S.Paulo, em 12/03/2011.

Um comentário:

  1. há q se considerar o que disse o presidente da wada: Criminosos controlam boa parte do esporte mundial, diz associação antidoping.

    os clubes que recebem recursos de times russos tlz levem notinhas com carimbo de grupos mafiosos. o hábito faz o monge, não o torna bonito.

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