quinta-feira, 6 de maio de 2010

Valeu, Fiel!


Ronaldo não foi o fiasco do primeiro jogo, Elias estava ligadíssimo, Dentinho, ligeiro como sempre, o time, com a garra tradicional. Porém, para mim, o grande destaque corinthiano ontem foi a torcida. Descontada a atitude bocó de algum “torcedor”, tragado pela imbecil moda da luzinha de raio laser na cara dos adversários, o comportamento da Fiel foi grandioso. Mais do que isso: emocionante, inesquecível! Antes, durante e depois da partida.

No decorrer da semana que antecedia ao jogo, sabedora da difícil missão do time, milhares de torcedores foram aos treinos incentivar os jogadores. Notem o termo: incentivar, não pressionar. No Pacaembu, a torcida esgotou todos os ingressos e, munida de apitos, bandeiras e dos tradicionais gritos de guerra, empurrou o Timão até o fim. É claro que no ocaso da partida, naquele momento em que o saudoso Fiori Gigliotti narrava “crepúsculo de jogo, torcida brasileira”, a Fiel mais rezava do que propriamente torcia, pedindo aos céus o milagre do gol. E ele só não veio na falta cobrada por Chicão porque milagrosa foi a defesa de Bruno.

Só que o mais bonito – lindo mesmo – foi a manifestação da torcida ao final do jogo. Confesso que fiquei com nó na garganta e com um imenso orgulho de ser corinthiano. Em vez das vaias, cobranças e ameaças contra os jogadores, como na eliminação para o Palmeiras em 2000, ao contrário da tentativa de invasão de campo, como se vira na derrota para o River Plate em 2006, enfim, em vez de contribuir para a geração uma nova crise que fatalmente desestabilizaria o time daqui em diante, a Fiel mostrou que continuará sendo um importante apoio. A torcida amadureceu? Quem sabe. É fato que a dor, o sofrimento – sentimento tão corinthiano –, ajuda a tornar os espíritos mais sóbrios, serenos, fortalecidos. Talvez por conta do calejar de sonhos frustrados na Libertadores, a Fiel tenha descoberto que melhor que o desespero é a resignação honrosa e a persistência. Quiçá, compreendeu que o sonho não acabou: foi, uma vez mais, adiado.


O Corinthians, dado o comportamento da Fiel, não sai da Libertadores em crise, mas em paz. Claro, uma paz sem-graça, sob frustração, mas uma paz necessária à continuação do trabalho de Mano Menezes, competente treinador que já nos trouxe de volta à primeirona e nos deu dois títulos.

Sim, o Corinthians mais uma vez foi eliminado da Libertadores. Por mais algum tempo será lembrado pelos arquirrivais de que jamais levantou essa taça, alimentando ainda mais sua obsessão por conquistá-la. Parênteses: sustento a tese de que o Corinthians necessita de algum sofrimento como motivador histórico, tendo substituído o sofrimento do jejum de títulos pelo sofrimento da obsessão pela Libertadores; ou seja, esse sofrimento, de uma forma ou de outra, cumpre uma função, diria, existencial para o time e para os torcedores. Sem sofrimento, não há garra, não há luta de verdade, não há Corinthians. Fecha parênteses.

O centenário virou “sem ter nada”? Talvez. E daí? Há que se aprender que no futebol, não há espaço apenas para a lógica, a eficiência, a dita competência produtiva: os resultados. O futebol é – e jamais deixará de ser – o universo emocionante da caixinha de surpresas, do sobrenatural de Almeida, do imponderável. Ganhar ou perder, sim, fazem parte desse mais-do-que-esporte, dessa cosmologia chamada futebol. Para vivê-la em plenitude, deve-se aprender tanto a ser vitorioso como derrotado. Quem não se convence disso, embrutece a alma, vira um xiita enraivecido, valorizando as frustrações e não percebendo as próprias conquistas. Da eliminação de ontem, deve-se levantar a ideia de que não faltou competência aos jogadores, não faltou empenho, garra. O Corinthians, simplesmente, perdeu. Creio que a torcida, mesmo chateada, reconheceu isso.

O mais importante é que a Fiel mostrou, de fato, que nunca abandonará o Timão. Logo que terminou o jogo, recebi uma mensagem do meu cunhado, corinthiano roxo, dizendo: “Amanhã é dia de sair com a camisa do Timão”. Essa intenção, pelo jeito, generalizou-se. Hoje já vi vários corinthianos ostentando, orgulhosos, nosso manto sagrado.


A Libertadores um dia virá, assim como veio o “desjejum” em 77 e o Brasileiro em 90. Mas é bom saber que não depende da Libertadores o amor incondicional dessa massa de milhões de brasileiros apaixonados pelo escudo do Corinthians. Afinal, como diz a música do corinthiano Toquinho, “ser corinthiano é ir além de ser ou não ser o primeiro”.

JFQ
***

Em tempo: Infelizmente, não há como deixar de mencionar certos fatos. Hoje, o muro do Parque São Jorge apareceu pichado. Além disso, houve briga na saída do estádio.

Essas ações de uns tantos vândalos, contudo, não invalidam a beleza proporcionada pela massa da torcida corinthiana. Aliás, é importante não confundir vândalos com torcedores. (JFQ)

2 comentários:

  1. Sergio Augusto Nogueira10 de maio de 2010 às 17:51

    Fica uma pergunta no ar. O comportamento da Fiel dentro do Pacaembu durante o jogo não seria um reflexo dos preços abusivos dos ingressos e da mudança do perfil do torcedor dentro do estádio. Fora do estádio o pau comeu. Tá certo que foi apenas meia duzia. Mas no dia seguinte a cabeça do Mano estava à prêmio, injustamente. E o Ronaldo é o Ronaldo. ABÇ

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  2. Sérgio, dê uma olhada na postagem de hoje ("Torcida Contra"). Nela, relativizo um pouco isso que escrevi aqui. Certamente há uma divisão na torcida do Corinthians. Se, numa espécie de olhar marxista, há nessa divisão um contraste de classes, é, sim, algo a se pensar. Só não gosto de me sentir parte da burguesia nessa história...
    Abraço.
    João.

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