Xico Sá
Amigo
torcedor, amigo secador, uma ótima ideia a da "Placar", digna dos
tempos gloriosos da publicação, foi, mesmo antes de a revista chegar às bancas
e ser lida, rebaixada à condição de polêmica santa, cega e sem juízo.
As redes
sociais da Internet, tais como algumas pracinhas moralistas e fofoqueiras do
interior, pegaram uma capa antológica para Cristo. Nela aparece o genial e
genioso Neymar, do Santos FC mais uma vez campeão deste ano, crucificado como
Jesus.
Os
editores da revista usaram a crucificação como castigo público, talvez a imagem
simbólica mais velha e popular do mundo, para discutir as acusações contra o
atacante do Peixe e da seleção canarinha.
A capa
explica o motivo de pregar o jogador na cruz: "Chamado de 'cai-cai', o
craque brasileiro vira bode expiatório em um esporte onde todos jogam
sujo". Você pode discordar ou não do pensamento, mas daí a fazer disso uma
guerra pentecostal contra a sacada da "Placar", pelo amor de Nosso
Senhor Jesus Cristo.
Para
muitos, a revista estava comparando Neymar com o homem de Nazaré. Isso seria um
pecado mortal. Os editores foram condenados ao inferno em segundos. Fico
espantado com a treva, com a incapacidade de se fazer uma leitura menos
religiosa e mais sensata.
Não
duvido que alguns exemplares sejam queimados nos templos evangélicos e
católicos. Se bem que, como discordam do uso e culto às imagens, algumas
igrejas pentecostais não podem condenar por uma simbologia em que não
acreditam.
Você pode
até acusar a revista de apelativa, sensacionalista e outros adjetivos colados
ao exercício do jornalismo desde Gutenberg. Não consigo ver nem mesmo este
aspecto. Acho, no máximo, um recurso engraçado para ilustrar a reportagem. No
tempo em que nossa imprensa era mais criativa e bem-humorada, tínhamos capas e
mais capas, páginas e mais páginas desse naipe.
É certo
que não existiam as redes sociais, e apenas umas raras cartinhas, lavrando o
protesto moralista, chegavam às redações. Assim como é certeiro que jornalista
é um bicho orgulhoso que não gosta muito de ser contestado, tem dificuldade
para lidar com as críticas do ombudsman e não gosta de assinar o
"B.O." da seção "Erramos".
Bom que o
barulho do Facebook e do Twitter, em muitas ocasiões, seja capaz de
desconstruir manchetes vendidas como bombásticas e arrasadoras etc. Tudo isso é
muito positivo. A confusão com a metáfora da "Placar", porém, não faz
sentido. Modestíssima opinião para tentar colaborar com o debate.
Usamos
diariamente, até sem perceber, a imagem da crucificação. Fulano pegou alguém
para Cristo etc. Sinceramente é muito barulho por nada, minhas caras irmãs
Cajazeiras da pracinha do interior chamada Internet.
Publicado na Folha de S.Paulo, em 28/09/2012.
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