quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Origens operárias

Paul Doyle


Ainda que os galhos tenham revestimento de ouro, escorra petróleo das folhas e a casca seja feita de reportagens sensacionalistas sobre disputas imobiliárias multimilionárias e orgias movidas a champanhe, as raízes do futebol inglês continuam a ser operárias. E isso causa confusão.

Roberto Mancini, por exemplo, deve ter ficado espantado ao se ver como foco de críticas depois da vitória do Manchester City contra o Wigan, no começo do mês, em que reclamou da expulsão de Figueroa por ter bloqueado com a mão um passe dirigido a Aguero, que tinha tudo para marcar um gol. Programas de rádio e colunas de jornal expressaram profundo desdém por Mancini, como se ele tivesse maculado a pureza do futebol inglês com um gesto estrangeiro e profano. Pedir a expulsão de um jogador, ao que parece, é como exigir que um mineiro seja demitido de seu emprego, deixando sua família sem sustento. Ainda que a comparação seja absurda, tem forte apelo inconsciente.

Chutar ou socar um adversário não são ações que costumam receber críticas tão dogmáticas quanto pedir um cartão vermelho (ou aquela outra violação que costuma enfurecer os torcedores ingleses, cavar falta). É como se a violência tivesse uma integridade bruta, enquanto apelar pela intervenção das autoridades ou cair de propósito a fim de iludi-las e obter sua intervenção, tem algo inerentemente traiçoeiro.

Mancini não estava errado ao apelar por ação da arbitragem. Mas talvez tenha pedido a ação incorreta. Ele deveria ter o direito de pedir um pênalti, mesmo que o lance tenha acontecido na intermediária. As regras do futebol precisam remover uma lacuna legal. Os árbitros deveriam ter o poder de marcar pênalti em caso de certas faltas, não importa onde aconteçam.

A Copa Africana de Nações oferece um exemplo perfeito. Gana estava vencendo Botsuana por 1 a 0 quando Ramatlhakwane disparou com grande chance de marcar o gol de empate e dar um ponto para seu país em sua primeira participação no torneio. Mensah, de Gana, o derrubou, e o fez do lado de lá da linha da grande área.

Mensah foi expulso, mas não restava tempo suficiente para que isso fizesse diferença. Os jogadores ganenses restantes puderam formar uma barreira para bloquear a cobrança de Botsuana. Eis um exemplo perfeito de um time mais fraco que não recebeu justiça devido a um detalhe técnico da regra. É preciso eliminar essa lacuna.

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Tradução de PAULO MIGLIACCI
* Publicado na Folha de S.Paulo (Los Gringos), em 31/01/2012.

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