sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Carta ao jovem Neymar

Xico Sá

Amigo torcedor, amigo secador, peço a devida licença, como em outras oportunidades, para dirigir a palavra ao jovem Neymar, com quem gostaria de manter uma prosa, um lero, trocar uma ideia, sem conselhos, sem afagos, sem vigiar ou punir, verbos que não me cabem no figurino, afinal de contas não passo de um tiozão errado, meu caro, a virtude aqui passou longe.

Uma coisa eu te digo, menino, invejo a tua rebeldia, é serio, mesmo com alguns chiliques e não-me-toques, mesmo no egoísmo com a equipe e com o técnico, exerces o livre arbítrio e te refugias no individualismo, único momento em que és tu mesmo, independentemente de pais, mestres, mídia ou carreira. Certo ou errado, prefiro não julgá-lo, ninguém sabe o que se passa na cabeça de um homem em certos momentos, tenha ele 18 ou 80 anos.

O preço é alto, como em tudo a partir de agora, afinal de contas perdeste a condição de moleque livre numa pelada praieira de fim de tarde, tens vários donos, és uma commodity, como se diz na linguagem econômica, estás na bolsa de mercadorias e tens muita gente de olho no teu futuro e no teu dinheiro.

Sim, és um tremendo abusado, despertas invejas e ódios, mas nada diferente dos jovens do teu tempo, resguardadas as proporções que tuas atitudes e desobediências têm na imprensa. Mas longe de ser um rascunho de monstro, como insinuou o santo René Simões, técnico vítima da sensacional virada santista que ajudaste a construir com o teu repertório de dribles.

No teu caso, menino, fico com um cara que sabe muito, um dos mais sábios da crônica esportiva, o Alberto Helena Jr., meio século de jornalismo: "O monstro, creia, é Neymar... Ora, vá ver se estou na esquina", ele escreveu no seu blog. "Cada bocejo do menino vira vendaval, e ainda querem que ele se comporte como um cavalheiro inglês da era vitoriana."

No mais, meu jovem, já pediste desculpa, isso é sempre um gesto nobre -no futebol e principalmente com as mulheres, nunca te esqueças.

Ah, não quero mais te encher o saco, já foram tantos malas pegando no teu pé de ontem para hoje, mereces um sossego.

Quanto aos brucutus que te perseguem em campo, paciência, mas não custa nada pedir umas dicas de malandragem ao Serginho Chulapa, aí bem do teu lado. Aceite um abraço do tio. Sem mais para o momento, para cima deles, menino!



* Artigo publicado na Folha de S.Paulo, de 17/09/2010.

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