terça-feira, 31 de maio de 2011

O Barça e o futebol como deveria ser


Paulo Calçade

O mundo do futebol ficou a semana passada inteira discutindo como o Manchester United deveria jogar para deter o Barcelona na final da Uefa Champions League. Noventa minutos depois, com mais um espetáculo individual de Messi e um extraordinário jogo coletivo, só restava aplaudir. Até uma lenda como sir Alex Ferguson admitiu o show de bola. Os números confirmam o massacre: 12 finalizações corretas contra apenas uma e 63% de posse de bola.

Há 25 anos no banco de reservas dos ingleses, Ferguson pode fazer o que quiser, até imaginar que Carrick e Giggs vão dar conta de Xavi e Iniesta. Para agravar a situação, Busquets, normalmente o primeiro homem acima da defesa, também deveria ter sido acompanhado. Estacionado na área de Van der Sar, aos 24 minutos do segundo tempo, foi dele o passe para Villa fazer 3 a 1.

A decisão da Champions ajuda a explicar José Mourinho nas duas partidas semifinais. Ao colocar Pepe sobre Messi, o treinador português buscou um recheio para suas linhas de marcação, e impedir o argentino de jogar no vazio, como fez no sábado.

Ferguson foi corajoso ou ingênuo demais ao idealizar o Manchester com um gigantesco déficit de marcação. Veja: o time catalão joga com Villa e Pedro pelos lados, abrindo a defesa contrária e a mantendo no fundo do campo. Para os zagueiros Ferdinand e Vidic, o melhor negócio seria ter Messi como centroavante. Assim um deles marcaria e o outro atuaria na sobra.

Mas o futebol do argentino começa muito antes, no meio de campo, setor inexplicavelmente abandonado por Ferguson, que teve Carrick, Giggs, Park e Valencia na marcação a Iniesta, Xavi, Daniel Alves e Busquets. O resultado foi uma enorme superioridade técnica, numérica e vida mansa para o gênio.

Messi conseguiu permanecer fora das duas linhas de marcação. Rompeu a primeira com dribles e desestabilizou a segunda, pois Ferdinand e Vidic passaram o tempo entre a tentação de deixar o posto para pressioná-lo e a observação das falhas no meio-campo. Por isso Mourinho colocou recheio na bolacha das semis. Até ser expulso, Pepe foi um problema, depois...

O futebol coletivo do Barcelona irrita a turma acostumada ao jogo virtual, amamentada com replays demais. A mobilidade construída sobre o talento, o treinamento e o passe deram ao Manchester apenas oito minutos para sonhar. Com bolas curtas, o grupo de Guardiola parece jogar num gramado menor que o do adversário.

O Barça ataca e defende com a mesma intensidade. São tarefas coletivas, inclusive para o craque. Messi participa de tudo, principalmente do jogo efetivado sobre triângulos, criado para jamais faltar o passe. É simples: quando Busquets receber a bola, preste atenção no comportamento de Xavi e Iniesta.

Uma final contém responsabilidade demais, além do nível suportado pelo bom senso. Com tantos fatos e teses em jogo, alguns enfrentamentos são vistos como se o futuro do esporte dependesse deles.

Todo mundo com alguma intimidade com a bola é capaz de identificar o jogo mais bonito, o que não significa torcer por ele. Nem sempre a beleza sensibiliza o coração. Foi o caso da partida de sábado, no mítico e renovado Wembley.

Perde-se muito tempo pensando em como parar o Barça e quase nada em como imitá-lo. Pode ser utópico, mas entender o funcionamento do time catalão é mais útil que agredi-lo. Messi, Xavi e Iniesta são únicos, mas o estilo pode ser universal, não foi inventado por Pep Guardiola.

O Barcelona joga o futebol total. É técnico, tático, quase sem faltas. Wembley viu uma das maiores finais da Uefa Champions League que se tem notícia. Ferguson só poderia aplaudir.


* Publicado em O Estado de S.Paulo, em 30/05/2011.

O estilo Barcelona

Paulo Vinicius Coelho

 

Uma enquete do diário Marca, na Espanha, apontou que 89% julgam o Barcelona o melhor time da história. Mesmo sem valor científico, a pesquisa impressiona. Ainda mais porque o jornal é conhecido por sua ligação com o Real Madrid. A melhor resposta sobre esse assunto foi de Josep Guardiola: "Houve outras grandes equipes, algumas que não vi jogar, como o Milan de Sacchi, o Real de Di Stéfano, o Santos de Pelé. Fico feliz por saber que daqui a vinte anos, este Barcelona será lembrado assim".

Troque uma palavra. Em vez de melhor, único. O estilo do Barcelona não está apenas na posse de bola, nem na troca constante de passes. Está no jeito de marcar. Dos times citados por Guardiola, nenhum marcava por pressão por tanto tempo. Só o Milan de Sacchi, a Holanda de Michels, o Ajax de Kovacs avançaram a marcação, mas não havia preparo físico para jogar dois terços das partidas assim, como o Barça faz.

O jogo do Barça é arte, porque o time tem força. Não se tem a bola por tanto tempo sem retomá-la. E não se retoma no campo de ataque se não houver preparo físico para fazer isso. "Um jogador da seleção me disse que os adversários correm tanto atrás do Barcelona que, quando têm a bola, não conseguem chegar na grande área", disse Mano Menezes.

E ainda tem Messi! O melhor do mundo é único e joga numa posição exclusiva. Centralizado no ataque, recebe sempre às costas dos volantes. Quando Carrick voltava para bloqueá-lo, Iniesta ficava livre. Quando Giggs tentava acompanhá-lo, Xavi se liberava. Se Park tentava persegui-lo, esquecia Daniel Alves.

Na mesma medida em que os marcadores procuram por Messi, os observadores buscam adjetivos. O mais brilhante foi o ex-auxiliar de Alex Ferguson, Brian Kidd: "O Barcelona é a melhor coisa do futebol desde a invenção da bola".



JOGADA ENSAIADA

Recuo estratégico. Na sequência de clássicos com o Real Madrid, o Barcelona só foi parado na pancada. Mas é de se lembrar como José Mourinho marcou Messi. Tirou Pepe da zaga e colocou-o à frente dos beques, atrás dos volantes. Lembre-se que, antes da expulsão do luso-brasileiro na semifinal, o Barça empatava por 0 a 0. Depois do cartão vermelho, Messi marcou duas vezes.

Pressão de Muricy. O atual técnico da seleção brasileira, Mano Menezes, conta que costumava treinar maneiras de sair da marcação pressão quando enfrentava o São Paulo de Muricy Ramalho. Não há milagre, claro. Mas o treino consistia em jogar nas costas da pressão.

Ou seja, com passes curtos, criar triangulações que façam a bola chegar atrás do jogador que avança na marcação. Na derrota do Barcelona para o Arsenal, nesta Liga dos Campeões, o segundo gol inglês nasceu de uma jogada assim. Saiu da pressão e chegou ao campo de ataque livre.


* Publicado em O Estado de S.Paulo, em 30/05/2011.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Competitivo e banal

Tostão


Hoje, o Santos deve ter dificuldades para vencer o Cerro Porteño. Muricy Ramalho precisa criar opções de ataque. O time não pode depender tanto de Neymar.

Mudo de assunto.

Jogar de contra-ataque não significa, necessariamente, formar uma retranca. Sempre que a bola é recuperada, inicia-se o contragolpe. A equipe que toma a bola mais à frente é ofensiva e contra-ataca bastante.

Paulo César Carpegiani mostrou, contra o Fluminense, que sabe armar um time para jogar de contra-ataque e na defesa, com oito jogadores bem posicionados, marcando no próprio campo. Qualquer bom técnico sabe fazer isso, ainda mais quando tem dois atacantes rápidos e hábeis, como Dagoberto e Lucas. Dagoberto evoluiu bastante e aprendeu a finalizar. Lucas é um atacante. Não é jogador de meio-campo.

Mas Carpegiani não quer só isso. É um treinador inquieto, que gosta de futebol bonito e de criar variações. O que deveria ser virtude passa a ser deficiência quando não se consegue vitórias. O lugar- -comum conspira contra o treinador. O futebol, espelho da sociedade, só pensa em resultados. É o mundo competitivo e banal.

O Barcelona, por conseguir unir eficiência com beleza e qualidade, passou a ser símbolo da resistência contra o senso comum. O time catalão possui as principais virtudes dos grandes times do passado e do presente. Mas não foi fácil chegar a esse ponto. Os operatórios são cada dia mais numerosos.

O Barcelona é a única equipe do mundo que costuma marcar por pressão na maior parte do tempo, que atua com apenas um volante (Busquets), que não faz lançamentos longos nem cruzamentos para a área, para se livrar da bola e contar com a sorte, e que, em qualquer estádio, gosta de ficar com a bola. Por isso e por tomá-la com facilidade, tem, em todas as partidas, desde maio de 2008, maior posse de bola que o adversário.

Já o Manchester United, além de ter ótimos jogadores, é o maior representante do futebol equilibrado, organizado e regular. Raramente erra e perde. Mas é um time comum. Faz o que outros grandes fazem. A diferença está em executar melhor o que foi planejado.

Não será surpresa se o Manchester for campeão da Europa. Não será por um jogo que vou mudar meus conceitos. Se o Barcelona vencer, o que é mais provável, quem sabe surjam outros técnicos preocupados não somente com a vitória, mas também com a qualidade e a beleza do espetáculo.


* Publicado na Folha de S.Paulo, em 25/05/2011.

Nomes imortais

Ruy Castro


Houve um tempo em que, ao andar pela rua, você entreouvia pelo radinho de pilha dos porteiros a narração do jogo daquela tarde ou noite e, se saísse um gol ou jogada importante, era fácil saber o que estava acontecendo. Afinal, os jogadores se chamavam Boiadeiro, Beijoca, Bobô, Biro-Biro, Dinamite, Fio Maravilha, Chulapa, Alfinete, Grapete, Caçapava, e só havia um de cada com esses nomes.

Hoje, não é mais assim. Mesmo assistindo ao Brasileirão pela TV e ligando os nomes às figuras, você pode se confundir. E não estou me referindo aos dois Deivids, três Lucas, três Douglas e três Gabrieis que jogam nos times em disputa. Nem aos cinco Renans -dos quais três, espantosamente, são goleiros. Nem mesmo aos cinco Evertons (um deles, Heverton), oito Williams (incluindo os Wilians e Willians) e oito Felipes ou Felippes, dos quais só um é Filipe.

Estou pensando mais nos nove Thiagos (que compreendem os Tiagos, com ou sem sobrenome, e um Thiego), 11 Leandros (contando um Eliandro) e na profusão de rapazes chamados Alex, Aleks, Alex Silva, Alessandro (vários), D'Alessandro, Alec Sandro e Alex Sandro. Sem falar nos sete Diegos e quatro Diogos (o nome é o mesmo) e nos nada menos que 11 Rafaeis. Daí, vários terem de usar o sobrenome.

Mas meus favoritos continuam a ser os sons: Acleisson, Adilson, Anailson, Demerson, Emerson (dois), Gilson, Glaydson, Jackson (dois), Jefferson, Jobson, Joilson, Keirrison, Kleberson, Liedson, Madson, Maylson, Richarlyson, Vilson, Wallyson e, pode crer, seis Andersons, com ou sem chapeuzinho no a. Além de um Wallace, um Wendel, um Werley, um Wesley e cinco Wellingtons, com um ou dois eles e com ou sem gê.

Pensando bem, de que estou me queixando? Em que outra época teríamos Avine, Fransergio, George Lucas, Maicon, Maicossuel, Robston, Sheslon e Tressor?
 
* Publicado na Folha de S.Paulo, em 25/05/2011.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Ascensão e queda dos “menudos do Morumbi”

Müller e Silas surgiram como dupla inseparável, qual Neymar e Ganso, nos anos 80. Eram os principais integrantes dos “menudos do Morumbi”, equipe do São Paulo Futebol Clube, comandada por Cilinho, repleta de jovens talentos, além de craques mais experientes, como Dario Pereira, Oscar, Pita, Careca e Falcão.

Os dois passaram pela seleção brasileira, pela Europa e encerraram suas carreiras em 2004. Os dois iniciaram carreira de técnico, sendo que Müller tentou, ainda, os ofícios de comentarista esportivo e pastor evangélico.

Neste momento, ambos estão novamente em evidência, mas por razões bastante distintas. Silas comanda o Avaí nas semifinais da Copa do Brasil, em surpreendente campanha que pode culminar no título inédito e na vaga para a Libertadores de 2012. Müller, por sua vez, é objeto de matérias televisivas dando conta de sua sofrível situação financeira, vítima da própria prodigalidade em lidar com o muito dinheiro que amealhou ao longo da carreira.

Para saber um pouco mais das trajetórias desses dois grandes boleiros, indico o ótimo texto postado no Futepoca, “Dois craques, dois amigos e dois destinos distintos”:


JFQ

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Time equilibrado

Muricy, após fase problemática nos últimos jogos à frente do Fluminense, assumiu o Santos mostrando toda sua competência. Conquistou o título paulista e avançou às semifinais da Libertadores, após despachar, ontem, o bem montado Once Caldas.

O principal elogio que se ouve em relação a Muricy é que o time do Santos está mais equilibrado. Em outras palavras, a equipe da Vila, que já tinha um ataque competente, passou também a ter uma defesa menos vulnerável. Considerando os números, após a vinda de Muricy, caiu a média de gols marcados e despencou a de gols sofridos. Exagerando, o Santos deixou de ser uma equipe que vence de 10 a 9, para se tornar uma equipe que vence de meio a zero. O resultado é o mesmo: vitória. Aliás, o Santos de 2010 faturou o Paulista e a Copa do Brasil, enquanto o Santos de 2011 já conquistou o mesmo Paulista e está bem encaminhado na Libertadores. Segue a sina de campeão.

Questiono, apenas, esse conceito de “equilíbrio”. Equilíbrio supõe uma equipe competente não apenas no ataque, mas também na defesa e no meio, na direita e na esquerda, jogando sem a bola e com a bola, etc. Todavia, como um economista keynesiano, no caso, analisando os assuntos da bola, aponto: há vários equilíbrios possíveis, não apenas o que corresponde a uma organização tática que priorize a segurança da defesa. Pode haver, inclusive, uma equipe que busca seu equilíbrio na ofensividade ostensiva. Como o próprio Santos, inclusive, em 2010. Em suma, para mim, o Santos não é um time mais equilibrado com Muricy, mas um time cujo equilíbrio se fundamenta na defesa mais bem composta, ainda que isso piore sua força de ataque. Marca registrada do São Paulo tricampeão brasileiro (2006/08), sob o comando do mesmo Muricy. Trata-se, portanto, de um outro equilíbrio, a partir de uma opção do treinador, mas também capaz de fazer do Peixe um time campeão. Muito embora, como se viu ontem, no Pacaembu, as vitórias, agora, sejam acompanhadas de um pouco mais de sufoco.

Ainda sobre equilíbrios, vejamos o exemplo do, quiçá, melhor escrete do planeta no momento: o badalado Barcelona. Sabe-se que o Barça prima por ter a posse da bola, mantendo-a nos pés de seus jogadores por mais de 60% da partida, em média. Para isso, o time joga compactado, no campo do adversário, o que implica que seus atacantes marquem as saídas do rival, bem como que seus defensores iniciem a articulação das jogadas, e troquem passes à exaustão, sem errar. Para isso, é imperativo que todos os onze jogadores sejam qualificados tecnicamente; eis um equilíbrio tático que não suporta pernas de pau! Aliás, acredito que para “desequilibrar” o Barça seja necessário impedi-lo de manter tamanha posse de bola; para fazê-lo, talvez seja o caso de não marcar Messi individualmente, mas, para começar, de marcar muito bem Piqué e Puyol.

JFQ

Mano convoca seleção para amistosos


O técnico Mano Menezes convocou 28 jogadores para os amistosos contra a Holanda, no dia 4 de junho, no Serra Dourada, em Goiânia, e diante da Romênia, quatro dias depois, no Pacaembu, em São Paulo. As principais novidades da lista do treinador são o goleiro Fábio, do Cruzeiro, Thiago Neves, do Flamengo, e Fred, do Fluminense.

Ronaldo Fenômeno será o 29º atleta chamado pelo treinador para a despedida no confronto na capital paulista.

Após a partida diante da Romênia, no dia 7 de junho, Mano Menezes cortará seis atletas e divulgará a lista de convocados para a Copa América no Pacaembu, em São Paulo. A estreia da Seleção será no dia 3 de julho, contra a Venezuela, em La Plata.

Lista de Convocados

Goleiros

Julio César (Inter de Milão)
Jefferson (Botafogo)
Victor (Grêmio)
Fábio (Cruzeiro)

Laterais

Daniel Alves (Barcelona)
Maicon (Inter de Milão)
André Santos (Fenerbahçe)
Adriano (Barcelona)

Zagueiros

Lúcio (Inter de Milão)
Thiago Silva (Milan)
David Luiz (Chelsea)
Luisão (Benfica)

Volantes

Lucas Leiva (Liverpool)
Ramires (Chelsea)
Sandro (Tottenham)
Henrique (Cruzeiro)
Anderson (Manchester United)

Meias

Elano (Santos)
Elias (Atlético de Madri)
Lucas (São Paulo)
Thiago Neves (Flamengo)
Jadson (Shakhtar Donetsk)

Atacantes

Robinho (Milan)
Neymar (Santos)
Alexandre Pato (Milan)
Nilmar (Villarreal)
Leandro Damião (Internacional)
Fred (Fluminense)

* Notícia extraída de http://globoesporte.globo.com/futebol/selecao-brasileira/noticia/2011/05/fred-thiago-neves-e-fabio-sao-novidades-de-mano-na-selecao.html

terça-feira, 17 de maio de 2011

O mundo do futebol e suas (des) lições


Pasquale Cipro Neto

Nelson Rodrigues dizia que o futebol é a coisa mais importante entre as menos importantes. Concordo, mas, parodiando o grande L. Babo, eu teria um desgosto profundo se faltasse o futebol no mundo.

Para mim, o futebol é beleza, estratégia, magia. Como torço para o Juventus, ou seja, para ninguém, fico livre para ver o que me interessa nos jogos: o talento e a capacidade dos atletas de articular as jogadas e de seguir a estratégia estabelecida.

Beleza e talento à parte, o futebol é também território de hipocrisia e de pouca inteligência. Quer coisa mais burra que a suspensão automática, imposta a um jogador que é expulso? Só no futebol alguém é culpado até que se prove o contrário… O árbitro acha que um atleta simulou uma falta (que houve), não marca a tal falta e dá ao jogador cartão amarelo -ou vermelho, se ele já tiver levado o amarelo. Depois do jogo, as imagens mostram à exaustão que o árbitro errou, mas a burra “regra” se mantém: o jogador está fora do jogo seguinte. O futebol é mesmo “burro, muito burro demais”.

O pior é ter de ler/ouvir a defesa da suspensão automática, sob o argumento de que, “se ela não existir, vira bagunça”. Tão ruim quanto essa “tese” é a de que condenar a suspensão automática é defender a impunidade. Condenar a suspensão automática é simplesmente condenar a impossibilidade de defesa, é condenar a condenação prévia, é condenar a pressuposição de culpa do atleta e a infalibilidade do árbitro. Só isso, nada mais do que isso.

O exemplo da suspensão automática é pretexto para um assunto “mais alto”: a capacidade de leitura, de interpretação (dos fatos, dos textos, do mundo). Quem entende, por exemplo, que a condenação da suspensão automática equivale à defesa da impunidade demonstra incapacidade de ler um texto e/ou fértil capacidade de tirar conclusões absurdas do que se diz/escreve. Paulo Freire dizia que a leitura do mundo precede a leitura da palavra. O futebol e suas belezas e mazelas estão no mundo, portanto…

Outro raciocínio genial que ouvimos no futebol é este: “Se o juiz dá aquele pênalti, era um a zero pra nós”. Diz-se isso onde quer que haja uma partida de futebol e, muitas vezes, também no rádio ou na TV.

Santo Deus! Será que ninguém é capaz de pensar que a consecutividade dos fatos gera entre eles uma relação tal que impede que se afirme que, “se o juiz dá aquele pênalti…”? É simples: o árbitro não marcou o tal pênalti; se o tivesse marcado, nada do que aconteceu depois do lance teria acontecido, porque a sequência seria outra, de modo que é simplesmente impossível afirmar qual teria sido o placar do jogo. Há outra aberração na tal afirmação (”Se o juiz dá aquele pênalti…”): por acaso pênalti é sinônimo de gol?

Na semana passada, houve mais “lições”. Terminado o jogo em que o Once Caldas eliminou o Cruzeiro da Libertadores, foi um tal de ouvir esta ladainha: “O time de pior campanha da primeira fase eliminou o de melhor campanha”. Elaiá! Como se pode dizer que a campanha do Cruzeiro, que na fase anterior estava no grupo X e, por isso, só enfrentou os times do grupo X, é melhor do que a do Once Caldas, que estava no grupo Y e, por isso, só enfrentou os times do grupo Y? A campanha do Cruzeiro só foi melhor que a dos integrantes do seu grupo, caro leitor.

Não se pode absolutizar o que é relativo, do contrário tudo pode dar errado: projetam-se pontes e prédios que caem, matam-se pacientes porque não se levam em conta os efeitos colaterais que determinados medicamentos podem provocar, tomam-se decisões que não seriam tomadas, arruínam-se relações que poderiam ter outro rumo. É isso.
 
* Publicado na Folha de S.Paulo, em 12/05/2011.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Caiu na rede, é bi!



Em um jogo morno (para dizer o mínimo), ainda mais se tratando de uma final, o Santos conquistou o bicampeonato paulista. O Peixe não foi brilhante, mas jogou para o gasto contra um Corinthians nada inspirado, incapaz de furar a sólida defesa formada por Muricy. Além do mais, o Timão mostrou falhas na defesa e incompetência na ligação entre o meio e o ataque. Aliás, não fossem os frangos tomados por Júlio César e Rafael, os goleiros passariam despercebidos na partida. Enfim, a peleja vista ontem, na Vila, ficou muito aquém daqueles emocionantes jogos finais do ano passado, contra um forte Santo André, ironicamente, um dos rebaixados em 2011.

À parte o ruim jogo final, o Santos mereceu o título pelo que fez durante o campeonato. Ou melhor, pela ótima equipe que vem montando, a bem da verdade, com a mente mais voltada à Libertadores do que ao Paulista.

São Paulo e Palmeiras foram as equipes que mais levaram a sério o campeonato, talvez por serem as que levantaram a taça há mais tempo, chegando nas duas primeiras posições ao fim da primeira fase. Mas, considerando o regulamento – tardiamente criticado – e a competência dos adversários nos jogos decisivos, nem um, nem outro estiveram presentes na final.

O Santos, que primou em 2010 pela força ofensiva, aplicando várias goleadas, na era Muricy vem se mostrando um time mais “equilibrado” – para usar um jargão da moda. Na minha modesta opinião, trata-se de um time mais preocupado com a defesa do que propriamente equilibrado, já que, não necessariamente, a melhora nos números defensivos deveria recair na queda do número de gols marcados. O fato é que o Peixe está vencendo, conquistando títulos e seguindo na busca por outros.

Hegemonia santista nos anos 2000

Após vencer do mesmo Corinthians em 1984, com o famoso gol de Serginho Chulapa, o Santos ficou 22 anos sem faturar um campeonato paulista. Antes de voltar às conquistas estaduais, banais na era Pelé, o Peixe faturou dois brasileiros: em 2002 (contra o Corinthians, de novo) e em 2004.

Aberta a porteira, contudo, passou uma boiada de conquistas santistas no Paulistão: dois bicampeonatos, em 2006/2007 e em 2010/2011. E só não esteve na final em 2008, disputada entre Palmeiras e Ponte Preta, já que tem 2009 foi vice-campeão, para variar, contra o Corinthians.

Enfim, com 5 títulos em 11 disputados, ninguém venceu mais campeonatos paulistas no século XXI do que o Santos. Ou seja, neste momento, é mais do que verdadeira a frase inicial do hino: “agora quem dá bola é o Santos”.

JFQ

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Opinião de Torcedor



O Santos será o campeão paulista de 2011, simplesmente porque "agora quem dá bola é o Santos" ou, se preferir, porque só ele tem os melhores jogadores do Brassssiiiiillllllllllllll.

Sandra Regina Ignácio, santista.

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O Corinthians será campeão porque estamos num ano ímpar.

Wlademir Corazzari Jr, corinthiano.

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Depois da era Pelé, está voltando o ciclo do Santos campeão.

Fernando Miyadaira, santista.

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O Corinthians é sempre forte na final. Além disso, o Santos está cansado pelo excesso de viagens e jogos.

Mário Borges, corinthiano.

Não é só cansaço

Daniel Piza


A derrocada dos brasileiros na Libertadores, com exceção do Santos, e alguns outros resultados surpreenderam muita gente, a começar pelos "especialistas" (se é que há especialista em futebol). A maioria das explicações apontou para o cansaço decorrente do calendário brasileiro, que é o que menos tempo oferece de férias e pré-temporada aos atletas. Mas o fator qualidade não pode ser menosprezado. Tal como os times, os comentários parecem sofrer do complexo de superioridade: nunca perdemos para um adversário melhor... Isso vale para clubes grandes do sudeste também. Se um Palmeiras toma seis do Coritiba, é porque estava ainda sob efeito da desclassificação para o Corinthians no Paulistão; se ganhasse, as mesmas pessoas diriam que foi porque o time agora podia apostar num torneio só.

Sim, já falei muito aqui sobre a necessidade de ter campeonatos estaduais mais curtos, que deem mais descanso aos jogadores e não encavalem na fase final com a de Libertadores e Copa do Brasil. As lesões estão aí para demonstrar a dificuldade. Hoje o Santos pega o Once Caldas sem Ganso e Arouca, ausências sérias, e com isso o Brasil corre o risco de ficar sem representante nas semifinais. Mas nada disso significa que a rodada passada foi uma manada de zebras, já que Cruzeiro, Internacional, Fluminense e Grêmio foram "saídos". Mesmo o Cruzeiro, que vinha jogando o futebol mais vistoso entre os brasileiros, com meias como Roger e Montillo e a revelação Wallyson, em nenhum momento foi brilhante. Admiro alguns recursos de Roger, mas um time depender tanto dele não podia ser bom sinal.

A realidade do futebol brasileiro é que sofreu uma entressafra considerável nos últimos anos, tanto que os melhores do campeonato de pontos corridos foram argentinos, volantes ou goleiros (salvo Adriano, que nem jogou nada demais em 2009 pelo Flamengo). Apesar do retorno de alguns craques, ou de ex-craques como Ronaldinho Gaúcho, o nível médio ainda não faz jus à história do futebol brasileiro. Desde o Cruzeiro de Alex em 2003, não se vê um time realmente memorável. E mesmo com o formidável surgimento de alguns nomes do ano passado para este, como os citados Ganso e Wallyson e mais Neymar e Lucas, entre outros, eles ainda são poucos e novos. Que bom que o Brasil ganhou os últimos mundiais sub-17 e sub-20, mas, claro, ainda é preciso que essa geração amadureça.

Esse engano sobre a real qualidade geral do futebol jogado hoje em gramados brasileiros foi visto também na reação a jogos como o primeiro da final entre Corinthians e Santos, domingo passado, no Pacaembu. Por ter tido três bolas na trave e algumas chances reais de gol, como a bola de Danilo encobrindo Júlio César que Chicão afastou, o empate por 0 a 0 foi considerado emocionante, um "jogão", etc. Não foi nada disso, embora não tenha sido monótono. Os dois times atacavam com poucos jogadores, de forma desarticulada, com número impressionante de erros de passes e chutes. Os laterais subiam pouco, os meio-campistas se concentravam na marcação, ninguém mostrava visão de jogo. Ambos os treinadores pensaram antes em anular do que em açular o outro. Fora algumas jogadas de Neymar, quase nada se via de criativo ou inteligente.

Felizmente o jogo não seguiu a rotina vigente no futebol nacional, a de uma quantidade de faltas de dar inveja a retrancas italianas. Pois não dá para refletir sobre o assunto sem considerar este dado. Tido e pranteado como um futebol "técnico", ele é cada vez marcado por trombadas, por desprezo à posse de bola, por jogadas aéreas. Jogadores como Neymar e Lucas vão na contramão. Precisamos recriar uma cultura que dê ênfase a esse estilo, brasileiro por excelência, que não confunde futebol-arte com malabarismo nem futebol-ciência com burocracia, que combina a invenção com a maestria. Como Pelé, que antecipava jogadas como um enxadrista e desconcertava zagueiros como um ilusionista, precisamos abandonar as dicotomias. Só aí deixaremos de viver apenas de quase aposentados e pseudo revelações.

* Publicado em O Estado de S.Paulo, em 11/05/2011.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Invictus


Fernando Matsumura

Esse filme a torcida do Flamengo conhece bem: nos últimos 05 anos, conquistou nada menos do que 04 campeonatos estaduais (2007, 2008, 2009, 2011). E mais uma vez a torcida rubro-negra soltou o grito de campeão. Assim como em 2009, quando ergueu a taça de campeão brasileiro e teve como um dos protagonistas uma figura controvertida – Adriano, o Imperador – em 2011, o expoente desse novo Flamengo se chama Ronaldinho. Não o Gaúcho, aquele que tanto nos encantou com seu futebol freestyle, mas o Carioca, aquele que sob a veste do manto sagrado, jogou pragmaticamente ao longo de todo o campeonato para se consagrar em sua 1ª temporada como campeão carioca invicto.

Dirigido pelo técnico Wanderley Luxemburgo, o time rubro-negro, que ainda não sofreu uma derrota nessa temporada, manteve a regularidade durante toda a competição, apesar dos números: conquistou a Taça Guanabara (1º turno) atropelando seus adversários, jogando um total de 09 partidas, com 08 vitórias. No entanto, apesar da conquista da Taça Rio (2º turno), o time obteve apenas 04 vitórias, em 10 partidas disputadas. Embora a queda de rendimento se justificasse pela presença já garantida na final, após vencer a Taça Guanabara, bem como pela disputa em paralelo da Copa do Brasil, o time vem apresentando dificuldades de criação e sem padrão de jogo definido, o que pode complicá-lo na reta final da Copa do Brasil. Se Luxembrugo pretende repetir o feito do Cruzeiro em 2003 quando conquistou a Tríplice Coroa, precisará mais do que Morgan Freeman (como Mandela) fez para motivar seus jogadores.

* Fernando Matsumura, torcedor do Flamengo, é colaborador do Ludopédicas.

Vitória do futebol

Tostão

Começaram os decisivos clássicos estaduais. Ontem, o Santos venceu por 2 a 0. O São Paulo criou várias chances de gol, mas finalizou mal. Foi a vitória do time que tem o melhor técnico e os dois melhores jogadores do Brasil. No segundo tempo, o Santos melhorou depois que Muricy trocou o centroavante Zé Love, amigo do Neymar, por um terceiro zagueiro (Bruno Aguiar) e adiantou os laterais, Elano e Ganso. Os técnicos estão descobrindo que um time não precisa, obrigatoriamente, ter um típico centroavante.

Hoje, Palmeiras e Corinthians têm as mesmas chances, embora o Palmeiras seja mais organizado. Discordo que seja um time de operários. Além de Valdivia e Kleber, que estão no nível de quase todos os melhores jogadores que atuam no Brasil, vários outros têm as mesmas condições técnicas que a maioria dos que jogam nas principais equipes brasileiras.

No Rio, outro clássico sem favorito. Parte da mídia e dos torcedores, por convicção, por não gostar de Luxemburgo ou pelos dois motivos, critica o Flamengo, mesmo invicto há 24 jogos, por não encantar, como se tivesse craques para isso. O time é igual aos outros. Ronaldinho, há muito tempo, é apenas um bom jogador.

Mudo de assunto. Ganso foi muito criticado por dizer que quer jogar na Europa, e Juninho Pernambucano, muito elogiado por voltar e jogar de graça pelo Vasco. Penso diferente. Ganso foi sincero, disse quase o óbvio, e isso não significa que não tenha afeição pelo Santos nem que não vá se esforçar para jogar bem.

Juninho, e qualquer atleta, mesmo rico e agradecido ao clube, precisa ser profissional, cumprir obrigações e exigir direitos, a não ser que volte somente para receber homenagens e encerrar a carreira. Quem não ganha não pode ser cobrado. Isso prejudica sua atuação. As relações têm de ser profissionais. O que precisa ser criticado é o profissionalismo ganancioso e irresponsável.

Do Brasil, viajo para a Espanha. Bastou o Real Madrid empatar com o Barcelona, graças a um pênalti inexistente, e ganhar por 1 a 0 na prorrogação para os adoradores de Mourinho ficarem eufóricos e dizerem que foi uma vitória da tática e que o Real passou a ser o favorito na Copa dos Campeões. Gostam mais de Mourinho do que de Messi.

Mesmo depois dos 2 a 0, nada está decidido. O Real ainda tem chances porque possui um excelente técnico, apesar de querer ser mais importante que o futebol, e, principalmente, porque tem vários excepcionais jogadores, ainda mais livre do violento Pepe, merecidamente expulso.
 
* Publicado na Folha de S.Paulo, em 01/05/2011.