segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Foi, Curintcha!

Antonio Prata





Das coisas mais bonitas que eu já vi: em Yokohama, Japão, do outro lado do mundo, um frio de bater queixo e o estádio apinhado de corintianos. Tudo preto, tudo -só com muita dificuldade se via, aqui e ali, esparsos smurfinhos do Chelsea.

Nem parecia que estávamos a 18.576 km do Pacaembu.

As faixas tomavam 360º do anel entre as arquibancadas: Fiel Capão, Guarulhos, Camisa 12, Tatuapé, Fiel Leme, Coringão Chopp, Fiel Morato, Curitiba, Fiel Cachoeira, Vila Moraes, Fiel Centro, Suzano, Fiel Soro-caba, Pavilhão 9, Cohab 5, Fiel Praia Grande, Taboão da Serra -e, não podemos deixar de mencionar, "Minha mulher deixou!", o que dá uma ideia da delicada situação conjugal que, em milhares de lares brasileiros, com o orçamento curto, ainda devendo prestação da TV e da geladeira, a decisão de passar uma semaninha no Japão deve ter criado.

Pois a mulher deixou, 30 mil mulheres deixaram, 40 mil, 50, jamais saberemos (tem que contabilizar os solteiros, também...): neguinho vendeu o carro, pegou empréstimo no banco, parcelou em três gerações, descolou casaco com o tio, ceroula com o primo, a avó tricotou a luva e cada corintiano presente no estádio fez valer o dinheiro, a paixão e o esforço que os trouxe até aqui.

Das coisas mais bonitas que eu já ouvi: em Yokohama, Japão, do outro lado do mundo, num frio de bater queixo e a torcida cantando, sem parar um único segundo: "Vamos, vamos Corinthians...", "Aqui tem um bando de louco!", "Timão ê ô", sem falar na vaia que ecoou pelo Oriente quando o Chelsea entrou para aquecer, uma vaia colossal, acachapante, digna de crônica do Nelson Rodrigues, que ainda estará zunindo nos tímpanos daqueles pobres e desolados bretões em seus últimos instantes sobre a Terra.

E não é que funcionou?

Como em raras vezes na vida, tudo deu certo. A torcida empurrou, o time respondeu, goleamos por 1 a 0. Torres foi anulado pelos peões -e, a essa hora, deve estar indo levar saudações alvinegras à rainha. David sumiu, sob o Golias corintiano. Oscar não deu nem pra Quiquito.

E Hazard, que em inglês quer dizer "perigo", se tiver um pingo de vergonha na cara, assim que pisar em Londres vai correndo a um cartório mandar botar um "No" antes de seu nome.

A equipe do Corinthians venceu pelo conjunto, mas dois jogadores merecem destaque. Cássio, que fechou o gol e levou merecidamente a Bola de Ouro (embora Muro de Ouro fosse o correto) e, claro, Guerrero. Que coisa mais óbvia e mais acertada, dessas que fazem a gente desconfiar, às vezes, que tem alguém nas coxias trabalhando no roteiro: um time que foi criado em 1910 por um cidadão chamado Bataglia conquista o mundo com um Guerrero. Melhor, impossível.

Foi, Curintcha!


Publicado na Folha de S.Paulo, em 17/12/2012.

2 comentários:

  1. Quem mais poderia ter sido o héroi do mundial com dois gols. Guerrero. Afinal São Jorge É o santo guerreiro.

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