segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Futebol, arte e os adjetivos da vida

“Arte, no futebol, nunca foi adjetivo.”

Sócrates Brasileiro

Glauber Piva 
O Sócrates foi um grande ídolo. Uma referência incontornável. Perdê-lo é ver esfumaçar o que dá substância aos nossos sonhos.
Mesmo palmeirense insistente, foi com Sócrates e Zico que aprendi a beleza do futebol. Foi com eles e alguns outros que percebi que futebol e arte compõem a mesma visão de mundo. É por isso que muitos dos que aprenderam a ver futebol no começo dos 80 preferem dizer que têm mais orgulho da seleção de 82, mesmo com a derrota, do que da de 94. O que difere uma da outra não é o título, mas os valores que o futebol de cada uma exibiu.
Mas Sócrates foi maior que todos os seus contemporâneos por ter tido a clara dimensão do que representava o futebol e do que ele próprio representava na árdua tarefa de fazer do Brasil um país melhor, mais inclusivo, justo, minimamente democrático.
Pelo que ele disse e fez, podemos afirmar que Futebol é arte por ser mais que um ambiente de competição: ele é um promotor de valores. Não é a quantidade de troféus que nos permitem gostar mais de alguns jogadores do que de outros, mas é a capacidade que cada um deles tem de nos afetar. E eles nos afetam pela maneira de jogar, de falar, de interagir com a torcida. Sócrates nos afetava!
Líder em campo, fez de sua preguiça um traço de elegância. Líder das massas, fez de seu punho cerrado uma senha de luta. Líder das ruas, fez de suas idéias os sonhos de muitos de nós.
A democracia corintiana nasceu de sua liderança e de seu futebol. Biro Biro não poderia ser o líder daquele sonho. Seu futebol não tinha arte, não tinha idéias. Sócrates, mais brasileiro que os ditadores, sabia que os calcanhares que exibia em campo fortaleceriam nossa luta grega, nossa conquista de Tróia, nossas “diretas já”.
Sócrates Brasileiro nos entregou, com arte, a certeza de que luta e alegria podem estar do mesmo lado do jogo, pois é a ética pública que garante o contorno da beleza democrática. É drible de corpo, é voto na urna, é comida na mesa, é estrela no peito, é bola no gol as coisas que valem. Tudo isso junto; tudo isso misturado.
Hoje, na sua despedida, nos cabe agradecer.
Obrigado, Doutor, por ter nos ensinado que a arte, no futebol e na vida, não pode ser adjetivo. 

* Glauber Piva é colaborador do Ludopédicas
Também postado em www.glauberpiva.blogspot.com

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