sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Mãozinha, mãozadas e arbitragem


Recentemente, dois fatos marcaram o futebol aqui e alhures: a mãozinha do francês Thierry Henry no gol que determinou a classificação da França para a Copa do Mundo e as mãozadas trocadas entre os palmeirenses Maurício e Obina, culminando na expulsão de ambos em jogo contra o Grêmio. Como pano de fundo, em um episódio e no outro, destaca-se a arbitragem. Para o bem e para o mal.

No primeiro caso, o gol de Gallas foi irregular duas vezes: além da “conduzida” de Henry, houve impedimento no lance. Esquecida esta irregularidade, tomando-se apenas aquela, ouve-se o veredito quase unânime: erro de arbitragem! Claro. Daí, a assertiva seguinte, logicamente derivada: “o juiz foi culpado e deve ser penalizado”. Não concordo. É muito fácil para quem vê o lance pela TV, repetido milhares de vezes, em câmera lenta, de vários ângulos, julgar a arbitragem. Entretanto, também a partir de um tira-teima, comprovou-se que a visão do árbitro estava encoberta. Ou seja, precisamos consolidar um entendimento que apesar de óbvio não é frequente: o árbitro e o bandeirinha são humanos! Isso não significa apenas que “erram”, mas que não são onipresentes, oniscientes e onipotentes; isto é, não são deuses! O fato do juiz não ter visto Henry colocar a mão na bola não quer dizer que tenha falhado. Aliás, estava bem colocado, porém encoberto. Simplesmente, era humanamente impossível, sem os recursos tecnológicos, naquele instante preciso e a olho nu, constatar a irregularidade. Ponto. Disto vem outra pergunta, não menos óbvia: por que não é admitido o uso de recursos tecnológicos para detectar tais irregularidades? Porque somos ferrenhos adeptos da máxima rodrigueana segundo a qual o vídeo-tape é burro? Até que ponto? Até quando entenderemos que faz parte do “universo encantado do futebol” a possibilidade de erros facilmente corrigíveis com a utilização de recursos tecnológicos simples? Ainda: até quando aceitaremos como desejável esse tipo de malandragem (sem necessariamente recairmos na ditadura afrescalhada do fair play)?

Talvez a tecnologia seja mesmo burra. No entanto, não parece muito inteligente críticas imediatas aos árbitro por irregularidades desse tipo. A propósito, a culpa – se é um culpado que procuramos – deve recair toda ela no jogador. Culpa pela falta ética ou do tal fair play, culpa pela revolta dos irlandeses e pela felicidade da parte mais pragmática da torcida francesa, que está pouco se lixando para essa frescura de ética e só quer comemorar a classificação sofrida, de fato, se não de direito.

Por fim, lembro que Thierry Henry declarou em 2006 que a vantagem futebolística do Brasil seria resultado da nossa falta de estudo, enquanto eles (franceses, europeus) seriam obrigados a dois períodos de estudo. Quer dizer, enquanto os garotos de lá não teriam tempo para a bola, dada a dedicação aos estudos, por aqui isso não seria problema. Caso verdadeira a tese do atacante francês, ao melhorarmos a qualidade de nossa educação seria de se esperar uma piora diretamente proporcional nos campos. Pode-se concluir, ainda, menos das palavras que das atitudes do mesmo Henry, que, se a diferença na educação pode explicar parte das diferenças entre brasileiros e franceses no futebol, não se poderia mais cogitar distinções quanto à nossa conhecida malandragem. Neste quesito estamos quites.

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No caso dos brigões palmeirenses, a sentença quase unânime de palmeirenses e rivais é que o árbitro Heber Roberto Lopes – na minha opinião, hoje, o melhor árbitro em campos brasileiros – acertou ao expulsar os pugilistas, quer dizer, os jogadores. E, acima de tudo, os jogadores erraram!

Por esses e outros episódios futebolísticos, faço um apelo: deixemos a arbitragem onde ela deve estar – como pano de fundo – e passemos a responsabilizar quem realmente faz o jogo: os jogadores. Não basta propagarmos que juiz bom é juiz que não aparece. Às vezes fazemos questão de colocá-los em evidência.

Em tempo:

Neste campeonato marcado por erros gritantes de arbitragem (de falta inexistente a gol de mão), merece menção o irretorquível trabalho do senhor Sandro Meira Ricci no difícil jogo Botafogo 3x2 São Paulo. Assim como seria perfeito o trabalho de Elmo Resende Cunha no jogo Palmeiras 2x2 Sport, não fosse aquela miserável comichão por assoprar o apito num momento absolutamente inoportuno. De qualquer forma, o empate pareceu o resultado justo. Assim como não me pareceram injustas nenhuma das tantas expulsões de jogadores são-paulinos nesse Brasileirão. No entanto, isso não convence o tricolor no Morumbi, talvez para manter o entendimento tradicional: a culpa é sempre mais do árbitro que dos jogadores.

JFQ

Um comentário:

  1. Tive o privilégio de acompanhar ao vivo todos os lances polêmicos citados e pude sentir a primeira impressão dos momentos críticos. Quanto ao boxe, a única coisa que falta dizer é que o Obina soca melhor com a esquerda do que chuta. Ouvi o árbitro do Palmeiras e Sport apitar duas vezes antes do gol, que ocorreira de qualquer modo.
    Mas o que achei mais interessante foi no lance da França: eu não vi a mão do Henry, mas apitaria a falta. É que no momento exato do toque de mão o goleiro e mais dois ou três zagueiros erguem a mão ao mesmo tempo, com uma reação isntantânea, até reflexiva. Já vi comentaristas fazerem observações do tipo "foi falta sim, ele nem reclamou". A malandragem que sobrou ao Henry faltou ao árbitro. Prestem atenção em qualquer jogo, sempre existem lances nos quais o juiz apita e espera a reação dos próprios jogadores antes de sinalizar uma infração ou um lateral. Por mais que existam jogadores que tentam cobra faltas mesmo sabendo que a posse é do adversário, as reações coletivas são indícios fortíssimos do que ocorreu verdadeiramente em qualquer lance.
    Quanto ao auxílio eletrônico, tem que ser implantado o quanto antes, imaginem como mudaria o comportamento dos jogadores e facilitaria o andamento da partida.

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